Os princípios jurídicos, ou melhor, princípios gerais do direito são orientações macro ou guias teóricos norteadores da política e da prática jurídica. Possuem subjetividade de conteúdo valorativo de característica genérica. Segundo Manoel Gonçalves, os princípios gerais do direito vão em direção a uma situação jurídica específica. As orientações gerais servem, sobretudo, para auxiliar o intérprete na hora de encontrar soluções à aplicação das normas. Principalmente quando elas não dão as respostas necessárias para a resolução do problema jurídico em questão. Os princípios possuem tríplice função, como indica o professor Inocêncio Mártires Coelho. São essas: a) função informadora para o legislado; b) função normativa para os casos de lacunas; e c) função interpretadora, como critério de orientação para o intérprete e para a magistratura (1).
Percebe-se que os princípios têm função de grande relevância no contexto de formulação, execução e interpretação de outras normas, de validade de atos administrativos e de condução de políticas públicas. Sabe-se que um ramo do direito só tem reconhecida a sua autonomia quando possui um arcabouço próprio de princípios específicos que lhes deem sustentação. Com o direito ambiental não seria diferente. Existe uma gama de princípios que lhes dão forma e estrutura científica. Não há uniformidade na classificação e no reconhecimento dos princípios que regem o direito ambiental, o que se percebe através de consultas aos diversos cursos e manuais de direito ambiental disponíveis no mercado editorial e também em artigos e periódicos especializados. Apesar das diferentes percepções, há um certo conteúdo mínimo em sede de princípios, que apontam para alguns valores fundamentais que alicerçam este tão importante ramo do direito público.
O princípio da prevenção é tido, à unanimidade pela doutrina pátria, como um dos mais importantes princípios do direito ambiental. Ademais, seu principal escopo é se antecipar ao dano, de modo que este possa ser evitado, ou ao menos minimizar o alcance do dano, quando este não puder ser completamente afastado.
Como assinala Zapater, o princípio da prevenção atua nos casos em que, segundo a doutrina, há “conhecimento científico” sobre as consequências de determinada atividade. Contudo, a noção de “conhecimento científico”, embora conste de textos normativos, não é capaz de indicar, por si só, qual o conhecimento científico considerado para fins da legislação. O conhecimento científico não é unívoco (especialmente quando se trata de estabelecer relações de causa-efeito), está sempre em movimento (falseabilidades) e não se comunica diretamente com os outros sistemas. A ciência, em larga medida, oferece suporte legitimador às normas jurídicas (assim como o direito oferece suporte de legitimação à política), mas é o direito quem escolhe e processa qual é a verdade científica a ser estabelecida como norma jurídica. O que o princípio da prevenção indica, segundo este autor é a existência de padrões fixados por normas jurídicas (incluindo normas técnicas de caráter infralegal, como resoluções dos órgãos da Administração Ambiental ou normas técnicas ABNT), relativos à qualidade ambiental de um dado ecossistema (equilíbrio necessário para as funções e serviços ecossistêmicos) ou ao impacto tolerável das condutas que se pretende desenvolver e que podem ser utilizados para estabelecer uma projeção das consequências esperadas e, correlativamente, das medidas que devem ser adotadas para evitar o dano ou mitigar suas consequências (2).
Infelizmente, a jurisprudência do STF não tem enfrentado a distinção entre os princípios da prevenção e o princípio da precaução, considerando-os como sinônimos, apesar dos alertas da doutrina pátria, ao menos em entendimento majoritário. A principal distinção entre os princípios da prevenção e o da precaução é que este último tem vez diante da ausência de conhecimento científico acerca dos riscos de danos efetivos ao meio ambiente em decorrência do desenvolvimento alguma atividade econômica, ou seja, diante de dúvidas sobre a não ocorrência de dano ambiental significativo deve-se optar pela não autorização da atividade objeto de licenciamento ambiental. Já o princípio da prevenção atua diante da certeza científica de dano ambiental caso não sejam adotadas determinadas práticas de controle. Desta forma, pode-se afirmar que o risco de dano ambiental existe (por exemplo, vazamento de combustíveis em postos de revenda) e que as consequências de sua ocorrência são bastante graves. Portanto, o empreendedor deve adotar as medidas cabíveis para reduzir ao máximo tais riscos de danos, conforme propõe a legislação especializada. Nos casos em que se aplicam a lógica do princípio da precaução, o risco de dano não é cientificamente comprovado. Desta forma, não há certeza científica se a atividade pode causar danos significativos ao meio ambiente ou se é pouco impactante. Sendo assim, pela lógica do princípio da precaução, deve-se adotar o seguinte entendimento: “in dubio pro ambiente“, ou seja, não deve ser permitido o desenvolvimento da atividade se não há segurança ambiental em sua realização.
Como se percebe, os princípios da prevenção e da precaução são os fundamentos maiores para a realização do licenciamento ambiental, uma vez que através deste procedimento administrativo, o órgão ambiental competente para o controle e fiscalização irá conhecer o projeto e avaliar se o mesmo pode ser implantado no local proposto e ainda, se durante a operação do empreendimento há conformidade com toda a legislação ambiental aplicável.
Esta é, em apertada síntese, a essência do princípio da prevenção, maior responsável pela fruição dos valores destacados no artigo 225 do Texto Constitucional de 1988.
Referências
(1) PANTOJA, Othon. Os 3 mais importantes princípios gerais do direito. Disponível em: <https://www.aurum.com.br/blog/principios-gerais-do-direito>. Acesso em 09 de outubro de 2022.
(2) ZAPATER, Tiago C. Vaitekunas. Princípio da prevenção e princípio da precaução. Disponível em: <https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/356/edicao-1/principio-da-prevencao-e-principio-da-precaucao>. Acesso em 10 de setembro de 2022.
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