Magistrada e especialista no tema, Trícia Navarro destaca a importância das plataformas online de resolução de conflitos
Trícia Navarro, Juíza de Direito no TJES, em exercício no cargo de Juíza Auxiliar da Presidência do CNJ
Nos últimos anos, o Poder Judiciário brasileiro vem se modernizando, implementando formas inovadoras de atendimento ao cidadão e de resolução de conflitos. A pandemia da COVID-19 acelerou algumas iniciativas que já estavam em andamento e motivou a criação de outras, em prol da continuidade da prestação jurisdicional.
Nesse viés, o Conselho Nacional de Justiça tem um papel fundamental no auxílio aos tribunais, na medida em que estabelece diretrizes que servem para orientá-los a funcionar de modo uniforme e seguro. O Ministro Luiz Fux, na qualidade de presidente do CNJ, estabeleceu como um dos eixos de sua gestão (4º Eixo – Justiça 4.0 e Promoção do Acesso à Justiça Digital) a necessidade de modernização do Poder Judiciário, por meio da implementação de programas, sistemas tecnológicos, uso da inteligência artificial, em prol do aperfeiçoamento dos serviços e da ampliação do acesso à Justiça.
Só para citar alguns exemplos, recentemente foram editadas resoluções com o objetivo de criar uma Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro – PDPJ (n° 335/2020¹ ), regulamentar a realização de audiências e sessões de forma virtual (n° 354/2020²), implementar o “Juízo 100% Digital” (n° 345/2020³ ) e o “Balcão Virtual” (n° 372/20214). Não obstante, a Resolução CNJ nº 358 de 02/12/20215 regulamentou a criação de soluções tecnológicas para a resolução de conflitos pelo Poder Judiciário por meio da conciliação e mediação. O referido ato normativo confere o prazo de 18 (dezoito) meses para que os tribunais disponibilizem um sistema informatizado para a resolução de conflitos por meio da conciliação e mediação – SIREC (art. 1°).
As plataformas on-line de resolução de conflitos, em inglês denominadas de Online Dispute Resolution (ODR), consistem em ambientes virtuais de resolução de controvérsias, substituindo os tradicionais encontros físicos para dirimir o conflito. No Brasil essa tendência vem ganhando cada vez mais destaque.
Na esfera pública deve ser ressaltada a criação da plataforma a “consumidor.gov.br “6. Nela o consumidor deve verificar se a empresa com a qual possui conflito aderiu à plataforma e, em caso afirmativo, registrar a sua reclamação. Feito isto, ele receberá uma resposta diretamente da empresa em até 10 (dez) dias, a qual poderá solicitar maiores informações acerca do problema narrado ou solucioná-lo.
Encerrado o contato entre as partes, a plataforma conferirá ao consumidor o prazo de 20 (vinte) dias para comentar e classificar a resposta obtida da empresa, bem como para informar se houve a resolução do conflito e a sua satisfação com o atendimento prestado.
Importante ressaltar que o “consumidor.gov.br” não substitui outros órgãos que atuam em prol do consumidor, e, por isso, recomenda-se que, em caso de insucesso na resolução do problema, o interessado procure o atendimento dos Procons, Defensorias Públicas, Juizados Especiais Cíveis ou de outras entidades do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor.
Já no campo privado, destacam-se as plataformas de resolução de controvérsias desenvolvidas pelo E-Bay e pelo Mercado Livre. Nelas o cidadão consegue solucionar, de forma célere, prática e menos custosa, conflitos decorrentes de relações travadas com empresas privadas que são cadastradas nos respectivos sites, evitando-se a judicialização do conflito.
Dentre as vantagens proporcionadas pelas ODRs estão a possibilidade de resolver o conflito de forma remota, a redução dos custos (deslocamento, despesas judiciais, etc.) e celeridade na resolução do problema.
Além disso, as plataformas virtuais de resolução de conflitos contribuem para a prevenção de futuros conflitos, para a melhoria do atendimento prestado pelas empresas e para o descongestionamento do Poder Judiciário, que se encontra repleto de demandas que poderiam ter sido solucionadas de forma extrajudicial.
Quanto às desvantagens das plataformas virtuais de resolução de conflitos, é possível mencionar que estas não atendem à parcela da população que não possui acesso à internet e não permitem o contato visual e simultâneo do consumidor com o representante da empresa, o que pode causar um desconforto ao usuário.
Ademais, também há grande preocupação com a confidencialidade das informações e o vazamento de dados.
Entretanto, as vantagens de utilização das ODRs devem ser evidenciadas, especialmente por representarem uma nova e legítima opção para o jurisdicionado resolver seus conflitos, empoderando-o a buscar as próprias soluções.
Portanto, deve haver uma maior divulgação dessas ferramentas, já que o uso da tecnologia é um caminho inevitável tanto na esfera judicial quanto na extrajudicial, sendo as plataformas virtuais de resolução de conflitos o presente e no futuro quando o assunto é a aplicação de inovação e garantia da efetividade em nossa sociedade hiperconectada.
[1] https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3496
[2] https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3579
[3] https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3512
[4] https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3742
[5] https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3604
[6] https://www.consumidor.gov.br/pages/principal/?1614123056892
TRÍCIA NAVARRO XAVIER CABRAL
Pós-Doutora em Direito pela USP
Doutora em Direito Processual pela UERJ
Mestre em Direito Processual pela UFES
Juíza de Direito no TJES, em exercício no cargo de Juíza Auxiliar da Presidência do CNJ
Professora da Graduação e do Mestrado da UFES
Membro do Comitê Gestor da Conciliação do CNJ
Membro do Fórum Nacional de Mediação e Conciliação – FONAMEC
Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP