Em entrevista ao Juristec, advogado potiguar destaca importância da cultura digital nos escritórios de advocacia

Para o advogado potiguar Rodrigo Menezes, o uso cada vez maior da tecnologia na rotina do Direito, acelerado com as medidas de prevenção ao Covid-19, deve ser mantidoapós a pandemia. Nesta entrevista ao Juristec, ele analisa as mudanças, diz o que pode melhorar e destaca a necessidade de se pensar um meio termo entre os ritos presenciais e aqueles realizados de maneira remota, desde que sejam evitados os “excessos”.

Rodrigo Menezes é Advogado Trabalhista Empresarial, Especialista em Direito e Processo do Trabalho, Pós-graduando em Compliance Trabalhista e Professor de Pós-graduação. Foi presidente da Associação Norte-rio-grandense dos Advogados Trabalhistas (2013-2019), Diretor da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (2016-2018), Vice-presidente da Caixa de Assistência dos Advogados do Rio Grande do Norte (2015-2018), membro da Comissão dos Advogados Trabalhistas da OAB/RN (2012-2018) e fundador do escritório Rodrigo Menezes Advocacia.

Abaixo, a íntegra da entrevista:

A pandemia tem mostrado um interesse cada vez maior do escritórios de advocacia realizarem sua transformação digital. O senhor acha importante essa transformação e como isso ocorre em seu escritório?

Rodrigo MenezesUm dos efeitos da pandemia, sem dúvidas, foi a maior utilização de tecnologias nas interações sociais, especialmente no que diz respeito às relações profissionais. Apesar da tragédia sanitária e humanitária, que vitimou milhões, o mundo precisou acelerar alguns processos a fim de se readaptar à nova realidade, e com a Advocacia não foi diferente. Este grave momento pelo qual passamos nos mostrou, por exemplo, a importância do processo judicial eletrônico, pois mesmo com os fóruns fechados foi possível manter a marcha processual ativa – embora durante um curto período todos os prazos tenham permanecido suspensos. O aumento no uso de tecnologias nas firmas já era um caminho sem volta, todavia a pandemia acentuou e antecipou diversas rotinas como o uso de aplicativos para a realização de reuniões telepresenciais. Nosso escritório sempre buscou acompanhar a evolução tecnológica aplicada à advocacia, o que facilitou o enfrentamento das dificuldades impostas pela pandemia. Trabalhamos com softwares de acompanhamento processual e jurimetria que utilizam inteligência artificial, o que nos permite uma melhor prestação de serviços junto aos nossos clientes.

Em que a tecnologia pode ser benéfica para a rotina de um escritório e, especificamente, na rotina de um advogado?

Rodrigo Menezes – A pandemia trouxe consigo o maior desafio já enfrentado pela nossa geração, e as tecnologias serão as grandes aliadas do ser humano. O fato é que isso forçou a advocacia a se adaptar. Atualmente os escritórios conseguem facilmente utilizar o regime de trabalho remoto em seu cotidiano. Sequer é necessário carregar um token de certificado virtual para peticionar. Os escritórios utilizam nuvem em suas operações, permitindo o acesso de documentos via smartphone em qualquer lugar. Com isso, agilizam a comunicação e a realização de atos – judiciais ou extrajudiciais, e acabam prestando um serviço melhor.

O senhor acha que os órgãos jurídicos, como as promotorias e os tribunais, estão promovendo uma transformação digital eficiente, no mesmo ritmo que está acontecendo com a sociedade, que está cada vez mais digital?

Rodrigo Menezes – Esses órgãos entenderam logo a necessidade de entrar no mundo digital, especialmente o Judiciário. A própria implantação do Processo Judicial Eletrônico é a maior prova disso. Em que pese as as críticas em razão da ausência da participação efetiva da advocacia em sua formatação, hoje, neste momento de pandemia, é ele que faz com que o Judiciário continue com a prestação jurisdicional. Ademais, o Judiciário também tem feito uso de I.A. o que agiliza a tramitação processual. Importante frisar que se pandemia ocorresse 20 ou 25 anos atrás, o cenário seria muito pior do que o atual, pois a conectividade era escassa, não havia smartphones e o trabalho telepresencial era inviável.

Por que, na sua opinião, é importante que os escritórios de advocacia passem a se utilizar mais da tecnologia?

Rodrigo Menezes – O uso de tecnologia pela advocacia é um caminho sem volta. Porém, a exclusão digital existente em nossa sociedade também alcança os advogados. Recente pesquisa do CESA (Centro de Estudos das Sociedades de Advogados) mostra que 78% não utilizam soluções desenvolvidas por Lawtechs e Legaltechs. Isso pode ocasionar uma concentração de clientes junto aos profissionais que fazem uso da tecnologia, pois conseguem por vezes diminuir custos na operação e fornecer um serviço com mais benefícios. Essa grande parcela da advocacia que não busca implementar tecnologias certamente ficará para trás se não buscar se adaptar à nova realidade.

Em que pontos o senhor acha que os tribunais deveriam melhorar para oferecer ao cidadão e aos advogados um atendimento eficiente do ponto de vista da tecnologia?

Rodrigo Menezes – Penso que o Judiciário deve ter como principal preocupação, no uso de tecnologias, garantir o acesso à Justiça, princípio cujo berço é constitucional. Não adianta implementar tecnologias que agilizem a marcha processual se essas não estiverem ao alcance de toda sociedade, incluindo os advogados. Não podemos esquecer que boa parte da advocacia está à margem dessa evolução. Judiciário e OAB devem ter uma olhar sensível para essa realidade.

A pandemia também tem tornado as sustentações orais mais rotineiras. Como ela tem sido conduzida pelo advogados, o que está bom e o que pode melhorar?

Rodrigo Menezes – Sinceramente, sou um entusiasta das sustentações orais por videoconferência. Sei que alguns colegas e parte dos magistrados preferem que esse ato se dê de maneira presencial, mas não podemos deixar de reconhecer que é vantajoso estar no escritório produzindo peças ou respondendo e-mails enquanto aguardamos a nossa vez de sustentar.  Ademais, a sustentação por videoconferência democratiza a atuação da advocacia, pois podemos “subir nas tribunas virtuais” das Cortes de todo o país sem a necessidade de ter os custos de deslocamento. Acredito que as duas formas de sessões podem conviver no âmbito do Judiciário. Torço para que isso aconteça.

Rodrigo Menezes destaca importância da sustentação oral

Houve muitos casos em que juízes reclamaram da conduta de alguns advogados durante as sustentações orais, seja por que, em alguns casos, os advogados fizeram essa sustentação até dentro de uma rede ou, em outro caso, sem gravata. O senhor acha que os ritos do meio jurídico devem ser mantidos durante essas sessões digitais ou o protocolo pode ser quebrado em nome da agilidade e da qualidade do julgamento dos processos?

Rodrigo Menezes – Entendo que essa formalidade imposta aos ritos reflete a importância e a seriedade da matéria tratada pelo Direito. O advogado tem ciência disso e deve respeitar os contornos da profissão. Trajar-se adequadamente é sinal de respeito a seus colegas, ao Judiciário, e, especialmente, aos jurisdicionados. Todavia, a formalidade nunca pode se sobrepor ao maior objetivo do processo, que é a aplicação de Justiça. Todo excesso deve ser combatido.

Que sugestões o senhor daria aos advogados que desejam fazer uma boa sustentação oral? No que devem investir e o que devem evitar?

Rodrigo Menezes – Primeiramente o advogado deve estudar muito o processo que será objeto de apreciação. Conhecer cada detalhe é de suma importância para uma sustentação oral sólida. Saber técnicas de oratória também é relevante, mas a evolução realmente só ocorre com a prática! Não adianta fazer cursos ou assistir outros colegas se você não estiver disposto a subir à tribuna e se expor na arena. Trazer os fundamentos técnicos corretos é o básico, mas para chamar a atenção dos julgadores por vezes é interessante buscar argumentos que nem sempre estão no Direito. Gosto muito de uma frase que diz: “quem só sabe direito, nem direito sabe. Isso pode mostrar uma boa formação e um poder argumentativo diferenciado. Se é para subir ir à tribuna e realizar apenas uma leitura do recurso, sugiro que não perca tempo. Melhor treinar bastante em casa ou no escritório e fazer uma sustentação oral utilizando anotações apenas para não esquecer algum tópico. Por fim, lembro que falar muito não é sinônimo de falar bem, uma sustentação objetiva certamente ajudará o entendimento de seus argumentos.

O senhor é a favor da manutenção dessa rotina dos tribunais, com sessões e julgamentos online, mesmo depois do fim da pandemia?

Rodrigo Menezes – Sem dúvidas, como disse, sou a favor da manutenção dessa rotina. Penso que somente as audiências de instrução deveriam ser presenciais. As demais poderiam ocorrer de forma telepresencial, desde que seja possível às partes o acesso à internet. Sabemos que muitos advogados dependem da estrutura da OAB para trabalhar, seja para produzir peças ou atender clientes. Certamente, a Ordem irá se adaptar para também suprir essa nova necessidade da advocacia e irá fornecer locais com boa internet e isolamento acústico para realização de audiências e sustentações orais que ocorram de forma telepresencial. Esse caminho implicará, creio, numa redução de custos do Judiciário, que poderá investir mais em outros setores, inclusive em tecnologia e permitir um aperfeiçoamento de sua eficiência.

O que o senhor acha que será adotado pelo ‘mercado’ e o que acha que pode ser revisto, após esse período crítico da pandemia?

Rodrigo Menezes – A pandemia nos mostrou que muitas coisas não necessitam ser realizadas de maneira presencial. Reuniões, cursos e atos processuais realizados por plataformas como Google Meet e Zoom são tão ou mais eficientes. Isso representa efetivamente uma diminuição no custo operacional do escritório. Ademais, há também uma mudança na mentalidade do advogado. Possivelmente os conflitos irão aumentar em razão do Covid-19 e, portanto, os profissionais devem efetivamente buscar soluções. Ou seja, deve-se assumir um papel estrategista, e para isso a análise de dados fornecida por softwares será de grande relevância. Enfim, como sempre valerá a máxima atribuída ao Darwinismo: “Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças”. E no Direito, que é dinâmico, sempre é momento para se adaptar.

FOTOS: Do Autor/Cedidas