Por Marline Negreiros, especial  para o Portal Juristec

Ainda neste mês em que é realizada a campanha anual “Outubro Rosa” em todo o mundo para conscientizar a sociedade sobre a importância do diagnóstico precoce do câncer do mama, o portal Juristec conversou com três especialistas e explica as possibilidades de amparo disponíveis aos pacientes com câncer no Brasil.

De acordo com a advogada Valquiria Schlemper, especialista em Direito do Trabalho do escritório MSA advogados, a lei 14.238/2021, que instituiu o Estatuto da Pessoa com Câncer, dispõe sobre os direitos fundamentais dos pacientes com câncer, sendo assegurados diversos benefícios.

Valquiria Schlemper, Pós graduada em Direito e Processo do Trabalho

Confira os principais:
1- o acesso ao diagnóstico precoce da doença;

2- o fornecimento de informações objetivas sobre a sua condição clínica, acesso ao tratamento universal, equânime, adequado e menos nocivo com direito a acompanhante durante o atendimento e período de tratamento;

3- direito a assistência social e jurídica, inclusive por meio de estímulos do poder público ao conhecimento e acesso aos incentivos fiscais e aos subsídios devidos à pessoa com câncer;

4- proteção do seu bem-estar pessoal, social e econômico;

5- direito à atendimento prioritário e assistência preferencial de atendimento nos serviços públicos nos órgãos públicos e privados prestadores de serviços à população, bem como na tramitação de processos judiciais e administrativos;

6 – A obrigatoriedade do atendimento integral à saúde da pessoa com câncer por intermédio do SUS, sendo aquele realizado nos diversos níveis de complexidade e hierarquia, bem como nas diversas especialidades médicas, de acordo com as necessidades de saúde da pessoa com câncer, incluídos assistência médica e de fármacos, assistência psicológica, atendimentos especializados e, sempre que possível, atendimento e internação domiciliares.

7 – Isenção do IPI, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) é um tributo federal, que incide sobre a fabricação dos produtos produzidos no território nacional, a exemplo dos automóveis. O paciente com câncer pode se beneficiar dessa isenção quando possuir alguma deficiência física, visual, mental severa, profunda, advindas da doença.

8 – A isenção do ICMS, o imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) é um tributo estadual que incide sobre a venda de bens móveis ou mercadorias, como os automóveis. O paciente com câncer tem direito à isenção do ICMS, ficam isentos do ICMS as saídas internas e interestaduais de veículo automotor novo, quando adquirido por pessoas portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou profunda, diretamente ou por intermédio de seu representante legal.

9 – A Isenção do IPVA, o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) é um tributo estadual, que incide, como o próprio nome indica, sobre a propriedade de todo e qualquer veículo automotor, como: automóveis de passageiros, aeronaves, motos, caminhões e embarcações.

10 – A isenção do IOF, o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) é um tributo federal, que incide sobre operações de crédito, câmbio e seguro e sobre operações relativas a títulos e valores mobiliários. O IOF incide, por exemplo, nas operações de financiamento para a compra de veículo automotor. O paciente com câncer pode ter o direito à isenção do IOF no financiamento para compra de veículo, portanto são isentas do IOF as operações de financiamento para a aquisição de automóveis de passageiros de fabricação nacional de até 127 HP de potência bruta, quando adquiridos por pessoas com deficiência física, atestada pelo Detran do Estado onde residem em caráter permanente, por meio de perícia médica, que deverá especificar o tipo de deficiência física e a necessidade e capacidade do interessado para dirigir veículo adaptado.

11 – O transporte coletivo urbano é um serviço de interesse local. Cabe, portanto, aos municípios definirem as regras para isenção de tarifas dos meios de transporte coletivo sob sua responsabilidade. O governo estadual também costuma administrar parte do sistema de transporte, sobretudo os intermunicipais. A maioria das legislações municipais e estaduais garante o direito à isenção da tarifa do transporte coletivo urbano para pessoas com deficiência. Em alguns locais, o direito à isenção dessa tarifa se estende a pacientes de determinadas patologias durante o tempo de duração de certos tratamentos.

Direito à Saúde

As advogadas Larissa L. Cortez Bonifácio e Lívia M. de Lima Costa, especialistas em Processo Civil e Direito à Saúde da C3 Advocacia, destacam também outras importantes possibilidades de amparo que os pacientes com câncer podem recorrer.

Segundo as especialistas, não podemos esquecer do auxílio-doença que é um benefício mensal devido ao segurado pela Previdência Social que, por mais de 15 dias, ficar incapacitado temporariamente para o trabalho em virtude de doença ou acidente. O paciente com câncer, segurado pela Previdência Social, tem direito ao auxílio-doença, desde que fique temporariamente incapacitado para o trabalho.

Já a aposentadoria por invalidez, é um benefício mensal devido ao segurado pela Previdência Social (INSS) que ficar incapacitado permanentemente para o trabalho em virtude de doença ou acidente e não sujeito à reabilitação para o exercício do trabalho. O benefício será pago ao segurado enquanto permanecer nessa condição. O paciente com câncer, segurado pela Previdência Social, tem direito à aposentadoria por invalidez, desde que fique comprovada sua permanente incapacidade para o trabalho.

Ainda também é possivel, requerer o Benefício de Prestação Continuada (BPC) – LOAS, é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência que comprovem não possuir meios financeiros para prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.

O paciente com câncer pode ter direito ao BPC caso possua 65 anos ou mais ou na hipótese de ter impedimentos de longo prazo (mínimo de 2 anos) de natureza física, mental, intelectual ou sensorial.

Saque de valores no FGTS ou PIS/PASEP

Vale destacar que o trabalhador ou a trabalhadora diagnosticado com câncer – e cadastrado no FGTS ou no PIS/PASEP – pode sacar os valores depositados. A advogada Valquiria Schlemper lembra que todas as pessoas que trabalham com carteira assinada possuem uma conta no FGTS. Nesta conta, 8% do seu salário bruto são depositados todos os meses pelo seu empregador.
“Desse modo, a lei prevê o saque do FGTS quando você for diagnosticado com câncer. Bastará você fazer um requerimento para a Caixa Econômica Federal, conforme dispõe a lei nº 8.036/1990, em seu artigo 20, XIII e XIV, e o Decreto nº. 99.684/1990 nos artigos 35, inciso XI e 36, inciso VIII”, ressalta.

Também é importante não esquecer que o valor pode ser sacado pelo titular da conta que possuir dependente – esposo(a), companheiro(a), pais, sogros, filho e irmão menor de 21 anos ou inválido – portador de alguma dessas doenças. As advogadas Larissa L. Cortez Bonifácio e Lívia M. de Lima Costa, esclarecem que é de salutar importância apresentar os documentos(carteira de trabalho, documentos pessoais e cartão cidadão ou número de inscrição PIS/PASEP); atestado médico com validade de 30 dias, contendo as seguintes informações: (- Diagnóstico expresso da doença – Estágio clínico atual da doença/paciente – CID – Classificação Internacional de Doenças. – Data, nome, carimbo e CRM do médico com a devida assinatura); Cópia do laudo do exame histopatológico ou anatomopatológico que serviu de base para a elaboração do atestado médico; Comprovante de dependência, no caso de saque para o dependente do titular da conta acometida por neoplasia maligna (câncer); Atestado de óbito do dependente, caso este tenha vindo a falecer em consequência da moléstia.

O prazo para os saques dos valores do FGTS devem ser disponibilizados ao requerente no prazo de cinco dias úteis, contados a partir da solicitação do saque.

Dificuldades no acesso aos benefícios

O artigo 196 da Constituição Federal prevê que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. “Caso haja dificuldades do paciente com câncer de obter acesso aos benefícios previstos na lei, e tendo em vista tratar-se de um dever do Estado, por intermédio do SUS, em garantir o fornecimento do tratamento adequado e ao atendimento integral a pessoa com câncer nas diversas especialidades médicas, incluídos assistência médica e de fármacos, assistência psicológica, atendimentos especializados, deverá recorrer, inicialmente, de maneira administrativa, no caso de falta de medicamentos, ao SUS ou a Secretaria Estadual ou Municipal de Saúde, solicitando o fornecimento aos medicamentos para o respectivo tratamento, e em caso de negativa ou não concessão, deverá ingressar judicialmente o pedido de fornecimento do medicamento. No caso de tempo de espera, ausência de profissionais e de equipamentos para o tratamento, o paciente deverá ingressar com uma ação judicial, por meio da Defensoria Pública, Ministério Público ou por um advogado particular para que haja a efetiva concretização do acesso ao direito a saúde”, explica Valquiria Schlemper.

Direito à reconstrução mamária

As especialistas em direito à Saúde, Larissa L. Cortez Bonifácio e Lívia M. de Lima Costa, ressaltam a importância de um direito bastante esquecido: o da reconstrução mamária (Lei 13.770/2018), que é a cirurgia plástica reparadora da mama, retirada, total ou parcialmente, em virtude do tratamento do câncer.

Elas alertam que todo paciente com câncer de mama que teve a mama retirada total ou parcialmente em decorrência do tratamento tem o direito de realizar cirurgia plástica reparadora. Por lei, tanto o Sistema Único de Saúde (SUS) como o plano de saúde são obrigados a realizar essa cirurgia. Quando existirem condições técnicas e clínicas, a reconstrução mamária deverá ocorrer no mesmo ato cirúrgico de retirada da mama (mastectomia).

“Também importante ressaltar, que conforme a Lei 13.896/2019, nos casos em que a principal hipótese diagnóstica seja a de neoplasia maligna, os exames necessários à elucidação devem ser realizados no prazo máximo de 30 (trinta) dias, mediante solicitação fundamentada do médico responsável. Grande parte das pacients diagnosticadas com câncer devem iniciar o tratamento oncológico (cirurgia, quimioterapia ou radioterapia) no prazo máximo de 60 dias contados a partir da data da emissão do exame patológico, ou em prazo menor, conforme necessidade terapêutica do caso registrada em prontuário (Lei 12.732/2012)”, destacam.