Com presença simultânea nos planos físico e digital, setores como saúde e comércio passam por revolução tecnológica

O rápido avanço da tecnologia em diversos setores do cotidiano e a aceleração proporcionada pela Web 3.0, que cada vez mais incorpora elementos digitais ao mundo físico e vice e versa, consolida o que vem sendo chamada de era “figital” (da contração físico + digital), na qual a hiperconexão torna-se parte do dia a dia dos negócios e da sociedade. IA (Inteligência artificial), IoT (internet das coisas), criptomoedas, NFTs, metaverso, gameficação, realidades estendida, virtual e aumentada fazem parte desse novo mundo.

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“A principal distinção entre o digital e o figital é justamente a sensação de telepresença, que possibilita uma maior imersão e adiciona um elemento social a atividades que anteriormente, em um contexto puramente digital, costumavam ser desempenhadas de maneira individualizada”, diz Juliana Roman, mestre em direito pela UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e pesquisadora do Iris (Instituto de Referência em Internet e Sociedade), sediado em Belo Horizonte (MG).

A tecnologia 5G é um dos fatores que viabiliza a Web3.0 e impulsiona o figital, uma vez que amplia o acesso à realidade estendida como bem de consumo. “Anteriormente, o acesso a esses ambientes virtuais imersivos dependia de o próprio usuário dispor de equipamentos com grande poder computacional, o que inviabilizava seu uso por uma parcela significativa da população, especialmente em mercados emergentes”, afirma Victor Vieira, também é pesquisador do Iris.

Quando falamos de negócios no mundo figital, é comum que empresas que nasceram no ambiente físico aumentem a presença digital, assim como o inverso. A Amazon, por exemplo, vem ampliando a sua presença física com a rede de lojas de conveniência Amazon Go, tendo como diferencial o pagamento 100% automatizado, e a Amazon Style, que utiliza a tecnologia de aprendizado de máquina para encontrar roupas de acordo com as preferências do cliente.

Alexandre Uehara, fundador da Innov8 Mindset & Strategy, afirma que a Amazon é um dos exemplos de marcas que priorizam conhecer o cliente e entregar uma experiência melhor, independentemente do meio em que atuam. Para ele, na realidade figital, empresas com origem em loja física precisam entender o digital, e vice-versa. “O cliente, não importa onde esteja, deve se sentir próximo da marca e ter a sensação de que é especial ”

“Não podemos, em hipótese alguma, pensar que basta somar as experiências anteriores no mundo físico com as experiências anteriores no mundo digital. É preciso estar ciente de que se trata de uma transformação”, afirma a professora Heloísa Omine.

Cada vez mais presentes no cotidiano dos consumidores, tecnologias como VR (Realidade Virtual) e AR (Realidade Aumentada) fazem parte dessa transformação. Na área da saúde, por exemplo, hospitais e laboratórios vêm utilizando a chamada “realidade mista”, união da VR (que proporciona total imersão em um cenário 100% digital) com a AR (que cria novos elementos no ambiente físico, seja com imagens, gráficos ou textos) na elaboração de diagnósticos, com diferencial de modelos do corpo humano tridimensionais.

Para Frank Sinatra Chaves, presidente da FCDL-MG (Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas de Minas Gerais ), trata-se de um salto para o desenvolvimento, ainda que, neste momento, se mostre menos acessível para as empresas menores. “O pequeno não sabe, não tem suporte financeiro nem estrutura para entrar. Para esses, essa nova área deve demorar um pouco ou, pelo menos, aguardar que surjam soluções que deem aos micros e pequenos negócios o espaço para se instalarem facilmente e com pouco investimento nessas áreas.”

“Com softwares acessíveis ou gratuitos, além de hardwares a preços acessíveis, acredito que será possível ampliar o potencial da realidade estendida e, consequentemente, dos benefícios e riscos inerentes a ela”, afirma Juliana Roman, do Iris.

TOUR VIRTUAL E IMÓVEIS COM CRIPTOMOEDA
A transição para o figital ocorre de forma acelerada no mercado imobiliário, melhorando a experiência dos clientes e promovendo a interatividade. As visitas, antes realizadas presencialmente, agora são guiadas à distância por corretores com videochamadas. Há ainda o uso de imagens em 360º, imersão com óculos 3D, bem como emprego de AR e a VR para que possíveis compradores visitem imóveis ainda na planta em um tour virtual.

Arthur Igreja, especialista em tecnologia, inovação e tendências, afirma que a experiência do consumidor no momento de conhecer um projeto, passar pelo processo de compra ou receber o imóvel é cada vez mais imersiva. “É excelente poder usar esses recursos tecnológicos, mas não se pode descuidar do relacionamento com os consumidores, seja nas redes sociais ou no atendimento. São pontos que precisam sempre ser observados”, diz.

Outra inovação vem do uso de novas formas de pagamento. Segundo Igreja, cada vez mais lançamentos imobiliários físicos já são acompanhados com NFTs (tokens criptográficos que representam algo único) e transações de pagamento feitas com criptomoedas (transações com tecnologia blockchain que garante mais credibilidade e evita fraudes).

Apesar de recente, o metaverso, rede de mundos virtuais baseada em AR e VR, já marca presença no mercado imobiliário. Hoje é possível, por exemplo, comprar terrenos e imóveis virtuais, além da divulgação e comercialização de empreendimentos do ambiente físico. Segundo dados da MetaMetric Solutions, a venda de imóveis no Metaverso ultrapassou US$ 501 milhões (R$ 2.58 bilhões) em 2021.

Mas ainda que o metaverso possa representar uma oportunidade de desenvolvimento de tecnologias para as empresas e novas experiências para os usuários, especialistas alertam para riscos no que diz respeito à proteção de dados pessoais e à privacidade dos usuários.

Para que tecnologias baseadas em realidade estendida possam funcionar, como é o caso do metaverso, é necessária uma extensa coleta de informações sobre os usuários. “Experiências figitais devem representar uma nova fonte de preocupação, uma vez que esses ecossistemas dependem de uma coleta de dados pessoais muito mais intensa para funcionar. Além disso, há um controle cada vez maior das empresas sobre esses dados, o que levanta receios quanto à privacidade e à proteção”, afirma Victor Vieira, do Iris.

FONTE: Folha Online | FOTO: Reprodução