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Estado foi julgado por assassinato de Márcia Barbosa de Souza pela Corte Interamericana de Direitos Humanos

O Brasil foi julgado por feminicídio e perdeu: a Corte Interamericana de Direitos Humanos reconheceu, em decisão pioneira, a responsabilidade internacional do Estado pelo assassinato de Márcia Barbosa de Souza 23 anos atrás. A notícia é da Folha Online.

No dia 17 de junho de 1998, por volta das 19h, Márcia recebeu um telefonema de seu algoz. Chegara havia pouco tempo em João Pessoa. Aércio Pereira da Lima, então deputado estadual pelo PFL (atual DEM) local, queria encontrá-la. Pouco depois, estavam juntos num motel.

Na manhã seguinte, um pedestre viu alguém tirar um corpo de dentro de um veículo, num terreno baldio em um bairro da capital paraibana. Era Márcia. Quando foi encontrado por autoridades, o cadáver apresentava “hematomas de tom azul-violáceo”, escoriações “na região frontal, nasal e labial” e vestígios de areia. A autópsia apontou asfixia por sufocamento como causa da morte, precedida por espancamento.

O assassinato da estudante negra de 20 anos escancarou várias vicissitudes machistas do sistema. O desfecho judicial é histórico por dois motivos, segundo Melina Fachin, professora de direito constitucional da Universidade Federal do Paraná que serviu de testemunha técnica no julgamento intitulado “[Márcia] Barbosa de Souza versus Brasil”.

Primeiro que o país, enquanto aparelho estatal, nunca havia sido condenado por feminicídio antes, diz Fachin. “E é também o primeiro caso que a corte julga sobre o tema da imunidade, um precedente super importante para estabelecer esse instituto à luz dos direitos humanos.”

O veredito do tribunal não foca apenas a vítima e seus parentes, explica Melina Fachin. O Estado fica obrigado, por exemplo, a criar um plano nacional para sensibilizar agentes que investigam crimes sob a ótica de gênero. “Tem um caráter muito mais amplo e transformador.”

A sentença desfavorável ao Brasil no tribunal das Américas destaca conclusões da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, também associada à OEA.

A delegação viu grave avaria ao “direito à integridade psíquica e moral” dos familiares de Márcia. Eles teriam sido desrespeitados não só pelo homicídio da jovem, mas pelo “atraso na abertura do caso contra o então deputado”, por ele ter vivido em impunidade por tanto tempo e pela duração de quase dez anos do processo penal.

O ex-deputado só foi levado a júri em 2007, após terminar sua jornada legislativa. Os jurados o consideraram culpado em primeiro instância. Ele recorreu em liberdade e morreu no ano seguinte, aos 64 anos, sem ter pisado na prisão.

FONTE: Folha Online | FOTO: Capital Photos