Convênio de orientação jurídica firmado entre as duas entidades dá proteção a jornalistas contra ameaças virtuais, inclusive de autoridades

Novos casos de profissionais da imprensa assediados na internet chegaram à Abraji e ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), depois do lançamento do convênio de orientação jurídica firmado entre as duas entidades, no fim de maio.

Na ocasião foi divulgada a cartilha com medidas para a proteção de jornalistas contra ameaças virtuais. Os profissionais, de São Paulo e do Rio de Janeiro, denunciaram ataques de autoridades públicas e passaram a receber apoio jurídico do Observatório de Liberdade de Imprensa da OAB, com a supervisão da Abraji.

Em junho, o jornalista esportivo Adriano Wilkson, do UOL, foi alvo de mensagens intimidadoras e ofensivas por parte do vereador paulistano Camilo Cristófaro (PSB), após apurar a ligação entre o político e Sergio Brito de Sousa — torcedor do Palmeiras envolvido em uma briga entre torcidas. A investigação deu origem à reportagem “Palmeirense que chamou corinthianos pra briga é ligado a vereador”.

Souza é assessor do gabinete de Cristófaro. À época, tinha sido exonerado, mas voltou ao cargo poucos dias após a publicação da matéria.
De acordo com o relato feito por Wilkson à OAB e à Abraji, Cristófaro deu início ao envio de mensagens grosseiras e ofensivas, desacreditando o trabalho da imprensa e do profissional, quando questionado pelo jornalista por mensagens no WhatsApp. O político também ameaçou iniciar campanhas de assédio on-line contra Adriano.

Entre as mensagens às quais a Abraji teve acesso, Cristófaro diz: “Que jornalistinha de m… que você é. Vocês estão todos falidos. Hoje rede social é que manda. Ninguém lê mais o que vocês escrevem. Vou meter você na minha página com 200 mil seguidores e mandar todo mundo mandar um abraço pra você. Você é uma farsa. Jornalistinha de m…, corintiano”.
Na sequência, o vereador enviou uma montagem com a foto do repórter e as frases “Adriano Wilkson. Parcial e tendencioso. Jornalista do UOL é Gaviões da Fiel”. Esses são apenas alguns dos comentários enviados pelo vereador a Adriano, como mostrou reportagem do UOL.

No dia 7 de junho, Wilkson também descobriu que uma conta com seu nome, telefone e o endereço da redação do UOL em São Paulo (SP) havia sido criada no site de compras e vendas OLX. O anúncio foi retirado do ar três dias depois. O perfil simulava que o repórter vendia camisas de times de futebol, entre eles Corinthians, Palmeiras e São Paulo. Adriano passou a receber mensagens e ligações de pessoas interessadas nos produtos e notificou a plataforma sobre a fraude.

Apesar de não se saber ainda quem criou o perfil falso com as informações do jornalista, a prática configura doxing, um dos graves tipos de abuso virtual listados na cartilha do convênio entre Abraji e OAB.
Procurado pela Abraji, o vereador Camilo Cristófaro reforçou as desqualificações que fez a respeito do trabalho do jornalista Adriano Wilkson, mas diz “nunca ter ouvido falar” dos dados vazados e usados em represália ao repórter.

“Você é uma mentirosa”, bradou deputado estadual fluminense
O segundo caso incluído no convênio é o de Renata Cristiane de Oliveira, comentarista política do portal RC24H, de Cabo Frio no Rio de Janeiro. No dia 17 de junho, a profissional foi chamada de mentirosa pelo deputado estadual Mauro Bernardo, depois de republicar reportagem da Veja sobre os parlamentares que compõem a base política do governador fluminense Wilson Witzel.

No vídeo difamatório, o deputado não critica a apuração da revista Veja que fala da ligação entre Bernardo e Witzel. “Como sou mulher, negra, gay e microempresária do interior, fica muito mais fácil fazer o ataque”, diz Oliveira.

Bernardo, que é policial militar aposentado, vociferou: “Renata Cristiane, eu não sou de responder, não, mas você é uma mentirosa. Você tem que apurar as coisas porque o seu ‘face’ era importante. Agora, nem ‘face’ mais. Se você disser que eu tinha vários casos com o governador, você é uma mentirosa. Prova para mim e eu renuncio agora, porque eu tenho um cargo”.

As intimidações do deputado foram seguidas de áudios, em tom de ameaça, enviados anonimamente a Oliveira. “Renata Cristiane, os ossos do seu corpo estão com os dias contados. O Bernardo vai quebrar, vai desossar seu osso todinho (sic)”, afirmava uma das mensagens.

A comentarista política, então, publicou outro vídeo em resposta, lendo, no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro, as nomeações de parentes do deputado a cargos ligados ao governo estadual, apontadas pela reportagem de Veja. “Nepotismo é crime e consta na súmula XIII do STF (Supremo Tribunal Federal)”, esclareceu a jornalista.

Ela entrou, no dia 22 junho, com uma queixa-crime de calúnia, injúria e difamação contra o deputado estadual Mauro Bernardo.
A Abraji procurou o deputado Mauro Bernardo Bernardo e até o momento desta publicação, não obteve resposta.

Convênio Abraji/OAB

O convênio firmado entre Abraji e OAB prevê orientação jurídica básica para o primeiro momento em que um jornalista se sinta ameaçado ou seja hostilizado virtualmente em consequência do desempenho de suas atividades. A orientação é feita após o caso ser enviado pela Abraji ao Observatório de Liberdade de Imprensa da Ordem.

A OAB orienta sobre os primeiros passos que o jornalista deve dar de maneira a garantir sua segurança e assegurar o pleno exercício da liberdade de imprensa. Importante esclarecer que, em nenhum momento, essa orientação se tornará representação jurídica do jornalista.

FONTE: OAB Nacional | FOTO: Imagem de Tumisu por Pixabay