Jovem de 20 anos foi enterrado como indigente e morreu após ser jogado contra ônibus. MPF diz que legista do IML de SP escondeu causa real da morte, por agressões, em documentos oficiais.

A Justiça Federal de São Paulo aceitou denúncia do Ministério Público Federal (MPF) e tornou réu o ex-médico legista José Manella Netto por falsidade ideológica e ocultação de cadáver. Ele é acusado de omitir em um laudo em 1969 que Carlos Roberto Zanirato, militante político com 20 anos, morreu decorrente a sessões de tortura durante o regime militar.

Segundo o MPF, o documento omitiu as verdadeiras causas do óbito, a fim de encobrir a responsabilidade dos agentes da repressão. O relatório de Manella Netto, assinado em conjunto com outro médico, que já morreu, reafirmava a versão oficial do governo de que o militante teria cometido suicídio ao saltar na frente de um ônibus na avenida Celso Garcia, zona leste da capital paulista.

O documento oculta, segundo o MPF, uma série de lesões que não poderiam ter sido causadas pelo impacto, mas por agressões anteriores. “Embora soubessem a identidade de Zanirato, os médicos registraram que a vítima era um desconhecido”, diz o governo.

Ele foi enterrado como indigente, longe dos olhos de qualquer familiar ou amigo que pudesse notar as evidentes marcas de tortura no corpo. O governo foi condenado a indenizar a família pela omissão do nome e dos dados da morte e o fato de ter enterrado como indigente.

Zanirato era soldado em 1969, quando abandonou o Exército para integrar a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). Ele foi o primeiro militante sob custódia do Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (Deops/SP) a desaparecer.

Preso em 23 de junho, sofreu torturas por seis dias, até ser levado ao local onde os agentes da repressão o empurraram contra o ônibus, relata o MPF. Não houve perícia sobre o atropelamento nem fotos da ocorrência. Não foi instaurado inquérito policial para apurar o caso.

Para o MPF, a ação dos médicos do Instituto Médico Legal (IML) nos documentos colaborou para dissimular as circunstâncias em que os opositores da ditadura eram mortos.

O ex-médico legista chegou a ter o exercício profissional cassado após responder a um processo disciplinar no Conselho Regional de Medicina de São Paulo, em 1994.

FONTE: G1 | FOTO: Sanar medicina