A Fundação Universidade Federal do ABC (UFABC) é diferenciada das demais porque seu ano letivo é dividido em quadrimestres. Além desse diferencial, a UFABC, mesmo tendo apenas 13 anos, se tornou a única universidade pública do estado de São Paulo a aderir às cotas para pessoas trans por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu). Foi com essa reserva de vagas que o estudante trans não-binário Marieu Amaral, de 19 anos, ingressou no curso de Bacharelado em Ciências e Humanidades. A informação está no Jornal do Campus.

Marieu descobriu sua identidade de gênero aos 15 anos, sendo a única pessoa trans de sua escola. Ele lembra que em questão de orientação sexual a sua escola era bastante diversa, diferentemente de identidade de gênero, tanto que seus amigos não o entendiam. Assim, mesmo já tendo desenvolvido depressão por questões familiares, se assumir como trans fez com que sua saúde psicológica fosse ainda mais danificada. Diante disso, ele começou a faltar muito nas aulas, o que o deixou muito defasado, mas mesmo assim conseguiu se formar: “Não tinha vontade de ir à escola porque aquele era um espaço que me causava de alguma forma um desconforto”, comentou.

Para conseguir um emprego, ele tinha que omitir seu gênero e até interromper seu processo de transição. Por essa razão, Marieu opta por serviços informais e atualmente trabalha como diarista para conseguir alugar um quarto próximo ao campus de Santo André da UFABC. “Hoje eu trabalho fazendo limpeza e foi a melhor coisa da minha vida”, contou o estudante, que já limpou muitas repúblicas em torno da universidade.

Perguntado se já pensou em estudar na USP, Marieu afirmou que nunca quis pelo fato da Universidade não parecer ser inclusiva em questões sociais. “Eu espero muito que algum dia todas as universidades tenham cotas trans, principalmente na USP.”

Processo

Em 2016, uma funcionária trans terceirizada que trabalhava no campus de São Bernardo do Campo foi impedida de utilizar o banheiro porque causava “constrangimento”. A funcionária foi demitida e isso serviu de estopim para levantar a questão, segundo a também mulher trans Leona Wolf, coordenadora do coletivo LGBT Prisma – Dandara dos Santos.

Dessa forma, foi iniciado por parte do coletivo a luta pela regulamentação do banheiro e que se concluiu na Portaria nº 261 de 31 de Julho de 2017. Nela, a UFABC se comprometeu em garantir o acesso de pessoas trans a espaços segregados por gênero, fixar placas informativas, realizar uma campanha institucional e cursos de capacitação.

No entanto, de acordo com Leona, notou-se que a universidade estava menos violenta a pessoas trans, mas elas não conseguiam acessar a universidade. Assim, no final de 2017, foi aprovada a reserva de vagas para esse nicho na Escola Preparatória da UFABC, curso pré-vestibular gratuito da universidade. Mas ainda não era o bastante. Portanto, no começo de 2018, foi aprovado o projeto de reserva de vagas a pessoas trans junto à Comissão de Políticas Afirmativas, e em novembro a aprovação final pelo Conselho Universitário.

A universidade reservou 32 vagas, cerca de 1,5% do total. Destas, apenas 15 foram ocupadas. Ao jornal Folha de São Paulo, a pró-reitora adjunta de Assuntos Comunitários e Políticas Afirmativas da UFABC, Tatiana Lima Ferreira, afirmou que o percentual oferecido foi decidido tomando por base o tamanho da população trans dos Estados Unidos, com cerca de 1,8%, pelo fato do Brasil não ter estudos consolidados sobre o grupo em questão.

Na lista pública de aprovados no vestibular, o nome dos estudantes trans é omitido de forma que possa preservá-los. Segundo o estudante Marieu, apenas o sistema sabe seu nome civil e em todas as listas constam seu nome social.

FONTE: Jornal do Campus | Foto: João Paulo Falcão/Reprodução Internet

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