
Primeiro, que se o nosso País pretende ampliar o seu portfolio de commodities com vistas, principalmente, à exportação é fundamental que produzamos energia pari passu na mesma proporção capaz de movimentar tamanha moenda, logo, se observarmos os quatro principais grupos de produtos que compuseram a pauta de exportação nacional no ano passado, quais sejam, Agropecuária, Indústria de Transformação, Indústria Extrativista e Outros (energia elétrica; resíduos de metais de base não ferrosos e de sucata; material impresso; e demais produtos)1, todos precisarão para a produção ou extração de energia.
Segundo, para que tais produtos alcancem níveis de aceitabilidade desejáveis no mercado internacional ou mesmo os melhores preços é curial que aqueles tenham na construção dos seus processos produtivos ou extrativos um verniz cada vez mais intenso da perspectiva ambiental, o que de certo no caso do Brasil não será o maior dos desafios haja vista a diversidade natural da nossa matriz energética.
Para a Empresa de Pesquisa Energética – EPE2, empresa pública vinculada ao Ministério de Minas e Energia e instituída nos termos da Lei n°. 10.847/04, o Brasil tem um potencial de produção de energia elétrica através da matriz eólica offshore, ou seja, aquela produzida no mar, de até 700gw (setecentos gigawatts) em locais com uma profundidade de até 50m, dessa forma, para termos uma ideia da magnitude desse número é importante obtemperarmos que hodiernamente toda a capacidade instalada dos 869 (oitocentos e sessenta e nove) parques onshore, porquanto inexistem no atual momento em funcionamento ou experimento empreendimentos marinhos, é de apenas 24,1gw (vinte e quatro vírgula um gigawatts)3.
Contudo, apesar de alvissareiros tais números devem ser vistos com cautela tendo em vista que ditos estudos preliminares desenvolvidos pela EPE deverão ser aprofundados porquanto a necessidade de serem considerados dados meteoceonagráficos e restrições nas áreas exploráveis; áreas de proteção ambiental; rotas comerciais; rotas migratórias de aves; e áreas de exploração de petróleo ou outras com usos conflitantes.
________________________
1 Saiba o top 10 dos produtos mais exportados pelo Brasil em 2022. Disponível em: https://www.conexos.com.br/produtos-mais-exportados-pelo-brasil-em-2022. Acesso em: 01 de maio de 2023.
2 Roadmap Eólica Offshore Brasil. Disponível em: https://www.epe.gov.br/sites-pt/publicacoes-dados-abertos/publicacoes/PublicacoesArquivos/publicacao-456/Roadmap_Eolica_Offshore_EPE_versao_R2.pdf. Acesso em: 01 de maio de 2023.
3 Energia Eólica (Os Bons Ventos do Brasil). Disponível em: https://abeeolica.org.br/. Acesso em: 01 de maio de 2023.
Do ponto de vista do desenvolvimento tecnológico, haja vista a maior intensidade dos ventos marinhos; a profundidade das águas; a distância entre os parques e os pontos de conexão às redes de transmissão, etc.; a uma tendência natural de um maior crescimento técnico do equipamento offshore do que do onshore, o que de certo influenciará na produção de aerogeradores com uma capacidade produtiva maior do que os atuais 06mw (seis megawatts); o maior apuro nas fundações, bem como nas dimensões de pás e torres; nas redes de transmissão submarinas; e, por fim, no uso de correntes contínuas ou alternadas na transmissão da energia elétrica para o continente.
Tamanhos desafios técnicos repercutem diretamente no custo do megawatt gerado, o que no empreendimento onshore é de R$ 7.000.000,00 (sete milhões de reais) no case nacional enquanto no offshore é de R$ 14.300.000,00 (quatorze milhões e trezentos mil reais)4 – média global porque não há nenhum parque eólico offshore no Brasil.
Outro ponto que tem merecido a atenção dos entusiastas da novel fronteira energética é a capacidade do hodierno sistema de transmissão absorver a futura energia a ser produzida a partir dos novos parques que deverão ser implementados, haja vista a recorrente dificuldade das redes de distribuição em fazerem frente aos projetos eólicos onshore e solares já em curso, o que de certo exigirá dos empreendedores privados e dos Entes Governamentais certo grau de interação e planejamento, conquanto a maior complexidade técnica e o vulto econômico de tais empreendimentos.
O licenciamento ambiental é outra questão a qual deverá ser dedicada atenção já que em regra empreendimentos dessa natureza deverão ser edificados em biomas marinhos sensíveis, o que de certo a experiência acumulada nos licenciamentos de equipamentos litorâneos, habitat natural que guarda similitudes com aquelas vivenciadas no mar, servirá para mitigar riscos, além da realização de avaliações ambientais estratégicas, o que ajudarão a evitar atrasos no desenvolvimento, paralisações ou mesmo impedimentos quanto à edificação de parques eólicos offshore.
_____________
4 Energia eólica cresce 12,8% em 2022 no país; saiba como funciona. Disponível em: https://www.poder360.com.br/economia/energia-eolica-cresce-128-em-2022-saiba-como-funciona/. Acesso em: 01 de maio de 2023.
Por fim, no que diz respeito à necessidade de uma melhor regulação para o setor é necessário começarmos a temática ponderando que independentemente da metodologia de comercialização da energia elétrica produzida, quais sejam, através do mercado regulado ou do voluntário, os parques eólicos offshore serão instalados em áreas eminentemente públicas (plataforma continental, mar territorial ou área econômica exclusiva), o que difere vertiginosamente daqueles empreendidos onshore, que em sua grande maioria são construídos em imóveis de particulares.
Destarte, se inexistisse qualquer complexidade outra que não o robusto interesse coletivo descrito no parágrafo anterior, o que de certo não é o caso como visto anteriormente no presente estudo, por si só a atividade eólica offshore reclamaria por um marco legal específico para a atividade.
Outrossim, a exemplo do que já ocorre no direito internacional comparado, a autorização pública do uso de áreas marinhas para a exploração eólica deverá ser permeada de um caráter licitatório, garantindo, assim, o assentimento quanto ao uso daquelas mediante autorização, concessão ou permissão públicas, tudo à luz dos preceitos constitucionais norteadores da probidade administrativa, de legislação de regência previamente concebida e de chamamento público para o certame.
Nessa senda, caberá ao futuro marco regulatório do setor dirimir questões como o regime de uso das áreas marinhas (autorização, concessão ou permissão públicas); regras e diretrizes a serem respeitadas durante o procedimento licitatório dos interessados; previsão objetiva das cláusulas que deverão obrigatoriamente constar do instrumento público de outorga do direito de uso; prazos; hipóteses de prorrogação das contratações públicas; consequências para o outorgado na hipótese de inadimplência; regulação do descomissionamento, etc.
FOTO: Shuterstock