
Em sessão do Conselho Pleno da OAB Nacional realizada nesta segunda-feira (16/6), foi aprovada a proposição de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar a validade das expressões “infração ético-disciplinar” e “ato ímprobo” inseridas no artigo 339 do Código Penal, pela Lei 14.110/2020.
De acordo com a relatora, a conselheira federal Ana Laura de Miranda Coutinho (OAB-TO), a inclusão desses termos passou a permitir que condutas de natureza administrativa ou disciplinar, com diferentes níveis de gravidade, devem ser punidas com a mesma severidade aplicada a crimes de alto impacto social.
Ao defender o ajuizamento da ação no STF, ela ressaltou que os termos impugnados violam os princípios constitucionais da legalidade e da proporcionalidade. “A vagueza semântica dessas expressões compromete a segurança jurídica do cidadão e amplia de modo desproporcional a incidência do direito penal, em contrariedade à cláusula da taxatividade que o rege”, argumentou.
A relatora também manifestou preocupação com a ampliação do tipo penal de denunciação caluniosa, que pode gerar punições desproporcionais a advogados e servidores públicos por acusações falsas de condutas meramente éticas ou administrativas. “O Direito Penal, como último ratio, deve se restringir à proteção de bens jurídicos de maior densidade e gravidade, sem abrir margem para interpretações subjetivas ou arbitrárias”, acrescentou.
Entre os fundamentos jurídicos que sustentam a propositura da ADI estão:
— Violação ao princípio da legalidade (artigo 5º da Constituição Federal): as expressões “infração ético-disciplinar” e “ato ímprobo” são consideradas vagas e imprecisas, carecendo de densidade normativa penal que permita sua tipificação de forma clara e objetiva.
— Desproporcionalidade da pena: a redação atual do artigo 339 do Código Penal prevê pena de reclusão de dois a oito anos para condutas de gravidade muito distintas, o que contraria o princípio da proporcionalidade.
— Redundância normativa: a falsa imputação de ato de improbidade administrativa já é prevista no artigo 19 da Lei de Improbidade Administrativa, tornando a inclusão dessa conduta no Código Penal um exemplo de sobreposição normativa injustificável.
— Risco de criminalização excessiva: a possibilidade de interpretações subjetivas e distintas, dependendo do estatuto profissional ou regime jurídico, fere a segurança jurídica e aumenta o risco de arbitrariedades.
Por fim, Ana Laura de Miranda Coutinho ressaltou que a proposta de ajuizamento da ADI não busca despenalizar a denunciação caluniosa, que deve seguir sendo considerada uma conduta criminosa grave. “E, sim, corrigir o excesso legislativo que amplia sua incidência para hipóteses normativas abertas e de interpretação subjetiva, de modo a restabelecer os parâmetros de certeza, objetividade e proporcionalidade que legitimam a aplicação do direito penal no Estado Democrático de Direito.”