
Levantamento mostra que a situação do Brasil é a pior entre 11 países da região
O exercício da função de juiz tem provocado o adoecimento de magistrados no Brasil e em países da América Latina, revela a pesquisa inédita “Perfil da Magistratura Latinoamericana”. Segundo o estudo, um em cada três juízes brasileiros afirma tomar medicamentos regularmente para controle de estresse, ansiedade ou outras condições relacionadas à atividade jurisdicional – mesma média registrada no Uruguai, que também ocupa a primeira posição do ranking. O resultado menos ruim é o do Equador, onde apenas 9% declararam fazer uso de remédios.
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Os números apontam que a maioria dos juízes brasileiros – 51% – relata ter necessitado de tratamento médico, psicológico ou psicanalítico por problemas ou dificuldades emocionais ou psíquicas desde que ingressou na magistratura. À frente do Brasil, somente o Uruguai, com 53%. O Chile figura em 3º lugar, com 50%. O índice cai para 9% no caso de Porto Rico.
O levantamento foi realizado pelo Centro de Pesquisas Judiciais (CPJ) da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) em parceria com a Federação Latinoamericana de Magistrados (FLAM) e o Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (IPESPE).
“É evidente que enfrentamos um cenário gravíssimo, derivado da sobrecarga de trabalho, da desvalorização contínua da carreira, das violações às prerrogativas da magistratura e das ameaças a que vários de nós estão submetidos”, afirmou o presidente da AMB, Frederico Mendes Júnior.
De acordo com ele, o quadro se exacerbou recentemente devido ao crescimento dos ataques aos magistrados em razão de decisões tomadas nos cursos de processos judiciais. “Além disso, movimentos políticos passaram a atentar contra o Poder Judiciário para obter ganhos eleitorais – o que, ao final, acaba por prejudicar o cidadão que precisa recorrer à Justiça.”
Piora nos últimos anos
A sondagem indicou, ainda, que 77% dos juízes do Brasil “concordam muito” com a afirmação de que “o nível de estresse dos magistrados e magistradas é maior atualmente do que no passado”. Em Porto Rico, o patamar é de 70%, baixando para 67% no caso do Uruguai. No lado oposto, El Salvador ostenta 33%.
Os pesquisadores também perguntaram aos juízes se episódios de depressão, síndrome do pânico, crises de ansiedade e suicídio têm se tornado mais frequentes entre a categoria profissional nos últimos dez anos. O Brasil destacou-se novamente: 62% dos magistrados “concordam muito”. Em seguida, a Colômbia alcançou 40%, e a República Dominicana, 39%. Na outra ponta, o Panamá contabilizou 6%.
“Existe um adoecimento dos juízes da América Latina, mas a conjuntura do Brasil é a pior, já que lideramos os rankings”, lamentou Frederico Mendes Junior, para quem apenas a valorização da carreira será capaz de reverter o panorama. “Não me refiro unicamente a questões remuneratórias, também fundamentais. O que está em risco é a própria independência do juiz, que não pode ser afetada – seja por doenças, pela sensação de insegurança ou por pressões econômicas.”
Perfil da Magistratura Latinoamericana
Ao todo, foram ouvidos 1.573 juízes de 16 nações, porém, ao final, somente 11 delas constaram do relatório – Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, El Salvador, Panamá, Porto Rico, República Dominicana, Uruguai e Brasil –, visto que para o restante não se obteve um quantitativo mínimo de respostas.
O propósito do levantamento, que abrange questões sobre prestação jurisdicional, relação com outros Poderes e democracia, é conhecer o perfil dos juízes latinoamericanos e a percepção da magistratura a respeito do funcionamento do sistema judicial e dos entraves enfrentados, com vistas à formação de uma estratégia comum para o fortalecimento da independência judicial em toda a região.
O estudo apresentará, ainda, dados sobre discriminação dentro do Judiciário, ambiente de trabalho, utilização de redes sociais, atuação na pandemia e justiça criminal.
FONTE: Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) | FOTO: PIxabay