Sentença atende pedidos do MPF

A Justiça Federal condenou, nesta quinta-feira (3), o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Educação Pública do Estado do Pará (Sintepp) e dois escritórios de advocacia a restituírem os valores que cada um recebeu como honorários advocatícios por serviços prestados à Prefeitura de Marituba, na região metropolitana de Belém (PA). Os valores, que ultrapassam os R$ 7,4 milhões, deverão ser atualizados com juros e correção monetária. Ainda cabe recurso ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília (DF).

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Na mesma sentença, a Justiça Federal condenou o município de Marituba a aplicar exclusivamente na manutenção e no desenvolvimento do ensino fundamental público tanto o valor a ser restituído como o crédito oriundo de um processo ajuizado na Justiça Estadual, em que se discutiu o pagamento de honorários advocatícios com recursos provenientes do valor do precatório relativo a recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), atualmente Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).

Os valores deverão ser movimentados por meio de conta específica. A Justiça determinou que os pagamentos sejam realizados sob a forma de transferência eletrônica via crédito na conta bancária do destinatário, de forma que ficam vedados saques em espécie e emissão de cheques.

O juiz federal Henrique Dantas da Cruz, que assina a sentença, fundamenta que as verbas do Fundef, hoje Fundeb, são constitucional e legalmente vinculadas ao custeio da educação básica e à valorização do seu magistério, daí ser proibida sua utilização em despesa diferente dessa, tais como pagamento de honorários advocatícios.

Mesmo assim, acrescenta o juiz, “o município de Marituba, em vez de aplicar os R$ 62.113.226,10 no pagamento dos professores da rede pública municipal e no desenvolvimento e manutenção da educação básica, repassou valores para o Sindicato dos Trabalhadores da Educação Pública do Pará, o escritório de advocacia Beltrão e Visalli Advocacia e Consultoria Tributária e Walmir Moura Brelaz, por meio de um acordo fraudulento.”

Irregularidades – Na ação ajuizada em 2019, o Ministério Público Federal (MPF) argumentou que Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Pará e a Controladoria-Geral da União (CGU) constataram irregularidades na gestão dos recursos públicos federais provenientes do Fundeb destinados a Marituba. Os recursos foram repassados pela União ao município, por meio de precatório, em 1º de fevereiro de 2017, no total de R$ 62,1 milhões. O MPF apontou que o município utilizou indevidamente recursos do Fundeb, no total de R$ 7,4 milhões, de forma desvinculada à educação, para o pagamento de honorários advocatícios.

O juiz destaca que a Lei 11.494/2007, que regulamenta o Fundeb, dispõe que os “Fundos destinam-se à manutenção e ao desenvolvimento da educação básica pública e à valorização dos trabalhadores em educação, incluindo sua condigna remuneração”. Outro dispositivo proíbe a utilização dos recursos do Fundo no financiamento das despesas não consideradas como de manutenção e desenvolvimento da educação básica. “É por essa razão que as verbas do antigo Fundef, inclusive as que se qualificaram como complementação da União, têm destino único, qual seja, promoção do direito à educação”, afirma o magistrado.

A sentença acrescenta que “o ajuizamento da demanda perante a Justiça Estadual e o contrato de honorários constituíram uma simulação para aparentar a prestação de serviços advocatícios, quando, na verdade, a intenção das partes era desviar recursos públicos. Além do pagamento de honorários, a destinação dos 40% da cláusula terceira também viola frontalmente a destinação constitucional da verba.”

A decisão registra, ainda, que os recursos não foram repassados aos professores que, com vontade livre e consciente e em virtude de serviços advocatícios, repassaram o dinheiro para o Sintepp e para os dois escritórios de advocacia. “Também não houve manifestação de vontade para que o município de Marituba, antes de pagar seus salários, descontasse o valor dos honorários, a exemplo do que ocorre nos empréstimos consignados em folha. O dinheiro foi da conta do município de Marituba para as contas do Sindicato dos Trabalhadores da Educação Pública do Pará, do escritório Beltrão e Visalli Advocacia e Consultoria Tributária e de Walmir Moura Brelaz”, fundamenta o juiz federal.

Paragominas e Monte Alegre – Em outras ações, no Pará o MPF apontou à Justiça que o mesmo uso indevido de recursos do Fundef para pagamento de honorários advocatícios ocorreu em Paragominas, no nordeste do estado, e deveria ser evitado em Monte Alegre, no oeste paraense. Em ambos os casos a Justiça Federal também foi favorável aos pedidos do MPF, assim como no caso de Marituba.

No processo relativo a Paragominas a sentença é de julho de 2019. A Justiça Federal ordenou que o escritório de advocacia Moraes e Fonteles Advogados e Associados devolvesse ao município um total de R$ 14 milhões. O escritório recorreu da sentença e o caso agora tramita no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília (DF).

No processo relativo a Monte Alegre, a sentença foi publicada em fevereiro do ano passado, e proibiu a prefeitura de utilizar recursos de fundos federais da educação para o pagamento de honorários advocatícios ou para qualquer outra despesa que não seja investimento direto na educação do município. Em outubro de 2021 o MPF pediu à Justiça que obrigue o município a comprovar que vem cumprindo essa obrigação.

Saiba mais – Desde 2015, decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) impôs à União a obrigação de pagar R$ 90 bilhões para mais de 3,8 mil municípios brasileiros. A dívida é fruto de um erro no cálculo do valor mínimo anual por aluno repassado aos municípios por meio do Fundef.

A ação recebida pelo TRF3 foi proposta pelo MPF em 1999 e diz respeito à complementação de valores pagos pelo Fundef entre 1998 e 2006.

Mesmo que tenha sido uma decisão definitiva – a chamada decisão transitada em julgado –, vários municípios pelo país contrataram escritórios de advocacia para viabilizar o recebimento dos recursos. Em alguns casos, esses contratos repassam aos advogados até 30% do valor a ser recebido pelo município.

Nesse contexto, o MPF segue acompanhando a destinação do dinheiro e fiscalizando seu investimento para garantir a integral aplicação dos precatórios do Fundef na manutenção e no desenvolvimento da educação básica – como prevê a Constituição Federal.

Mais informações sobre o tema foram reunidas pelo MPF em uma página especial sobre o caso Fundef.

FONTE: MPF | FOTO: Pixabay