Humorista vai recorrer da decisão; ex-diretor da Globo alega ter sido ofendido nas redes sociais

Em decisão de primeira instância do Tribunal de Justiça de São Paulo, a juíza Tonia Yuka Koroku determinou que Rafinha Bastos pague R$ 50 mil de indenização a Marcius Melhem. O autor da ação se sentiu ofendido por um vídeo em que o humorista debocha de uma entrevista sua ao UOL sobre as acusações de ter praticado assédio moral e sexual no período em que foi diretor do núcleo de humor da Globo.

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Em tutela antecipada em janeiro de 2021, Rafinha já havia sido obrigado a apagar o vídeo de seus perfis no Twitter, onde soma 11,3 milhões de seguidores, e no Instagram, com 1,5 milhão de fãs. Como trata-se de decisão em primeira instância, ainda cabem recursos para alterar a sentença e Rafinha confirmou à coluna que vai recorrer.

“No caso concreto, o autor [Melhem] aduziu que o requerido [Rafinha] teria dirigido ofensas pessoais e diretas por meio de publicações em redes sociais, após a veiculação de matérias jornalísticas que teriam apontado o requerente como autor de supostos assédios sexual e moral contra terceiro”, diz o texto da decisão, ao qual a coluna teve acesso.

“Apontou que a conduta do requerido seria ilícita, posto que violadora de sua honra e imagem. Já o réu, em sua contestação, aduziu a ausência de ilícito, posto que decorrente do exercício de liberdade de expressão e de sua própria profissão de comediante.”

A defesa de Rafinha argumentou ainda que “outras pessoas também haviam se manifestado sobre a situação relativa ao suposto delito praticado pelo requerente, e que a referida situação havia sido amplamente noticiada”. Sustentou também “que apenas fez uma sátira sobre um vídeo que havia sido publicado pelo próprio requerente, em que fora entrevistado pelo portal de notícias UOL”, continua.

O vídeo de Rafinha foi baseado em entrevista, também em vídeo, concedida a Maurício Stycer em novembro de 2020, após publicação de reportagem da revista Piauí relatando vários episódios que configurariam suposto abuso sexual de Melhem como chefe na Globo. Na entrevista ao UOL, ele nega as acusações descritas pela Piauí, mas reconhece muitos erros: “Eu traí minha ex-mulher várias vezes”: “foi muito doloroso para mim”, disse na ocasião.

Rafinha usou a imagem da entrevista ao UOL para dublar a voz de Melhem em uma reedição tratada por ele como sátira. “Doloroso pra ti? Oi?”, questiona o humorista. Em seguida, a edição traz a imagem de Melhem com áudio regravado por Rafinha no mesmo tom do entrevistado, dizendo frases como: “Eu matei 48 pessoas, matei várias vezes, isso foi muito doloroso pra mim”; “Roubei oito bancos, roubei várias vezes, isso foi muito doloroso pra mim”, “Dei crack pra criança, e dei crack várias vezes, isso foi muito doloroso pra mim”.

A magistrada que decide agora favoravelmente a Melhem é a mesma que já havia determinado a exclusão do vídeo poucos dias após a sua publicação, argumentando que “o conteúdo ofensivo” “ultrapassa o mero exercício da livre expressão do pensamento”. “Os direitos fundamentais não são absolutos”, disse ela na ocasião. “O limite está nos direitos fundamentais das outras pessoas que podem ser atingidas, como é o caso dos autos.”

Na decisão desta quarta-feira (23), Tonia Koroku volta a dissertar sobre liberdade de expressão, reforçando mais uma vez seus limites. “No caso ora analisado, restou suficientemente comprovado que o réu abusou do exercício do direito de livre manifestação.”

Em outro trecho, diz a magistrada: “Não buscou o réu, nas postagens apontadas na petição inicial, apoiar a suposta vítima de assédio ou de posicionar-se contrariamente ao suposto delito, ao machismo, à misoginia, à discriminação sexual etc. Poderia até se manifestar nominalmente em relação ao autor, em tom de crítica ou desprezo aos fatos que lhe haviam sido imputados, mas não o fez. Preferiu apenas ofender o requerente. […].

“Se condenado pela prática de qualquer ilícito de natureza penal, deverá cumprir com as sanções que eventualmente lhe forem impostas pelas autoridades competentes”, ressalva a juíza na recente decisão.

No parágrafo final, a juíza conclui: “Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos, com a confirmação da tutela inicialmente deferida à fl. 72, para condenar o réu a obrigação de fazer consistente na exclusão das postagens listadas às fls. 67/71 e ao pagamento de indenização a título de dano moral no importe de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). O montante deverá ser corrigido monetariamente pela tabela prática do TJSP desde a data do ajuizamento da demanda e acrescida de juros moratórios de 1% desde a data do evento danoso (data da publicação da postagem ofensiva de 04/12/2020) […]”.

FONTE: F5 Folha Online | FOTO: Reprodução Instagram