Partidos não indicaram nenhuma mulher para as 36 vagas de titular e suplente da comissão da Covid

A ausência oficial de mulheres na CPI da Covid reflete uma resistência histórica à abertura de espaço a elas nas comissões parlamentares de inquérito, mostra levantamento feito pela Folha e publicado pelo jornal paulista nesta segunda (26).

Mulheres participaram como titular em apenas 32% das CPIs instaladas no Senado desde 1946, após o fim do Estado Novo de Getúlio Vargas, período em que essas comissões passaram a funcionar de forma efetiva.

Foram 68 CPIs instaladas desde então, com a participação de senadoras em apenas 22 delas.

Desde que a primeira mulher assumiu uma vaga no Senado —Eunice Michiles, em 1979—, 54 CPIs foram instaladas. A pioneira em uma cadeira na Casa também foi a primeira a atuar em uma comissão parlamentar de inquérito, além de outras quatro.

Ao tomar posse no Senado, a ex-professora do ensino básico foi recebida com flores pelos outros parlamentares. No entanto, os colegas não garantiram votos para a aprovação de suas propostas que visavam garantir mais direitos às mulheres durante seu mandato.

Os anos passaram e aumentou o número de mulheres indicadas pelas suas bancadas para compor CPIs. Mas mesmo essas indicações reproduzem estereótipos e preconceitos da vida política nacional.

“Geralmente, onde as mulheres ocupam posições de mais destaque são nas CPIs de temas mais sociais, como violência contra a mulher, tráfico de pessoas. Isso reflete a estrutura da nossa sociedade, que liga as mulheres às tarefas dos cuidados, enquanto os homens se ocupam das tarefas ligadas ao poder. Quando se foge desse estereótipo, as mulheres sofrem”, afirma a ex-senadora Vanessa Grazziotin (PC do B-AM).

Vanessa Grazziotin foi a primeira mulher presidente de uma CPI no Senado, a que investigou o tráfico nacional e internacional de pessoas a partir de 2011. A parlamentar também presidiu a CPI da Espionagem, instalada após o escândalo de espionagem internacional promovida pelos Estados Unidos, por meio da NSA.

A senadora Simone Tebet (MDB-MS) tem a mesma percepção. Ela diz que ainda existe resistência em colocar mulheres para compor comissões que não sejam ligadas à questão social.

“É como se mulher entendesse de política pública, política social e não entendesse de economia. É mais ou menos assim a divisão. Tanto é que nos 186 anos de história do Senado Federal, eu fui a primeira mulher a presidente da comissão mais importante do Senado, que é a CCJ [Comissão de Constituição e Justiça]”.”

Há atualmente 11 senadoras, que representam 13,5% da Casa, fatia que nem de longe segue a proporção feminina na população (52%) e que é fruto também da histórica baixa representação feminina na política.

Na montagem pelos partidos da composição da CPI da Covid, não havia nenhuma entre os 18 titulares, nem entre os suplentes. Só após pressão das senadores o presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM), lhes concedeu direito a uma representação informal.

Simone Tebet acrescentou que a CPI da Covid trouxe luz para parte das dificuldades enfrentadas por mulheres na política. Ela avalia que o olhar feminino é importante em todos os assuntos debatidos na Casa.

“Nós não temos acesso aquilo que é sigiloso [na CPI da Covid], então não tem o olhar feminino, clínico nosso, que não é melhor que dos homens, é simplesmente diferente. Essa complementabilidade faz parte da vida e ela é necessária. Faz com que as coisas dêem certo no ambiente familiar, no mercado de trabalho e na vida pública.”

FONTE: Folha de São Paulo | FOTO: Jefferson Rudy/Agência Senado