O decano do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, participou neste sábado (12/4) da Brazil Conference, em Boston, nos Estados Unidos. O evento é organizado por estudantes brasileiros de Harvard e MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts).

Entrevistado em um dos painéis, Gilmar falou do modo como o Supremo Tribunal Federal tem sido visto pela sociedade nos últimos tempos e não se furtou de tratar de temas espinhosos como a ‘lava jato’ e o julgamento dos réus que participaram da intentona golpista do 8 de Janeiro.

Ao ser questionado sobre a impressão de parte da sociedade de que o Supremo tem extrapolado seu papel, Gilmar negou ativismo por parte do STF e afirmou que essa impressão é provocada pela incompreensão das competências da corte.

“A Constituição não só consagra a possibilidade do Supremo controlar as ações que firam a Constituição, mas também as omissões inconstitucionais. Nós tivemos muitos problemas durante a pandemia. União, estados e municípios estão integrados. Mas vem a pandemia e o governo federal se ausenta do processo de proteção. O Supremo autoriza estados e municípios a aplicarem as normas da OMS. E por isso talvez o Supremo tenha sido acusado de estar interferindo em políticas públicas”, afirma.

Gilmar ainda afirmou que se o STF não tivesse interferido naquele contexto o número de mortos durante a crise sanitária provocada pela Covid-19 poderia ser ainda maior.

“Portanto, me parece que se existe algum ativismo, eu chamaria de uma situação de pró-ativismo, isso decorre da Constituição, do nosso modelo constitucional e tem sido feito, em geral diria eu, para o bem.”

‘Lava jato’

Gilmar também foi questionado sobre o seu papel incisivo contra violações cometidas pela auto intitulada operação “lava jato”. Ele afirmou que inicialmente votou a favor dos pedidos dos encarregados da investigação, mas percebeu com o tempo que havia excessos e violações ao devido processo legal e que essas impressões foram confirmadas pela chamada “vaza jato”.

“Eu fico muito orgulhoso de ter participado desse processo que você chamou de desmanche da ‘lava jato’, porque era uma organização criminosa. O que eles organizaram em Curitiba, lamentavelmente, era uma organização criminosa. Só para dar um exemplo para vocês que vivem nos Estados Unidos, em função talvez até da influência do cacoete americano, com honorários e coisas do tipo, eles colocavam nas cláusulas que 20% do resultado dos acordos iria para o Ministério Público. Nós dissemos, isso não pode. Aí eles criaram a tal famosa Fundação Dallagnol, com 2 bilhões e meio, para eles pagarem palestras e fazerem campanhas anticorrupção. Nada que tivesse nada a ver com o direito brasileiro”, lembrou.

Gilmar também refutou qualquer tipo de comparação entre a atuação do ministro Alexandre de Moraes e a do ex-juiz Sergio Moro durante a ‘lava jato’.O decano explicou que o ministro Alexandre não pode ser considerado suspeito para julgar os casos envolvendo a intentona golpista, já que passou a ser agredido e perseguido por extremistas justamente por ser relator do processo.

“Na verdade, ele já foi feito relator do processo e por isso tem sido agredido. Então seria muito fácil para qualquer investigado afastar o juiz a partir da afirmação de impropérios. É disso que se cuida, especialmente na rede social. Não só ele, mas a mulher dele, vão ao escritório, fazem ameaças às filhas. Portanto, é uma situação muito atípica e é preciso conhecer esses fatos. Então não há justificativa para ele ser afastado, uma vez que ele já era relator desses inquéritos e depois dos inquéritos que se agregaram. Então não se pode falar disso. Ele não é suspeito, não está impedido, não está julgando o seu interesse”.

Por fim, Gilmar lembrou de uma conversa entabulada com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em que ele lamentava a escolha de Sergio Moro para o posto de ministro da Justiça.

“Eu falei, presidente, talvez seja o seu maior acerto. Primeiro ter nomeado o Moro, depois ter devolvido ele ao nada.”

FONTE: Conjur | FOTO: Andressa Anholete/SCO/STF