O Supremo Tribunal Federal já decidiu que são válidas a terceirização (da atividade principal da empresa ou de outras tarefas) e quaisquer outras formas de relação de trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social. Assim, o ministro Kassio Nunes Marques, do STF, anulou, no início deste mês de fevereiro, oito decisões do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (Grande São Paulo e litoral paulista) que reconheciam o vínculo de emprego entre a seguradora Prudential — dona de uma rede de franquias — e corretores franqueados.

O magistrado determinou que sejam proferidas outras decisões, desta vez respeitando os precedentes vinculantes do Supremo sobre o tema.

“O caráter inédito da decisão reside no fato de o STF ter acolhido uma reclamação constitucional plúrima, anulando decisões em oito casos distintos, mas que tratavam da mesma matéria. Esse precedente abre a possibilidade de que novas ações semelhantes sejam apresentadas”, diz o advogado Cleber Venditti, da área de Trabalhista e Sindical do escritório Mattos Filho, que representa a seguradora.

“Caso sejam procedentes, isso poderá reduzir significativamente o número de reclamações junto ao STF, uma vez que será possível discutir vários casos similares em uma única reclamação constitucional”, completa ele.

Nas oito ações, o TRT-2 havia constatado que os franqueados precisavam participar de reuniões semanais, tinham metas a cumprir, seguiam uma agenda corporativa e eram supervisionados por superiores hierárquicos.

A Prudential, então, acionou o STF por meio de uma única reclamação constitucional e explicou que assinou contratos de franquia com empresas das quais os corretores são sócios.

“A opção por inovar e mover uma reclamação constitucional plúrima, questionando violação aos precedentes vinculantes da Suprema Corte perpetrada por múltiplos acórdãos em uma única demanda, tem como pano de fundo a necessidade de apresentar à corte um mecanismo para administrar um contingente de ações trabalhistas repetitivas, movidas de maneira oportunista, e cujo provimento judicial representa uma resistência, pontual porém renitente, em observar a sistemática de precedentes e em se adequar à disciplina judiciária”, afirma o diretor jurídico da Prudential, Pedro Mansur.

Nunes Marques concluiu que os acórdãos estavam “em descompasso” com a orientação do Supremo quanto à validade de terceirizações e outras formas de divisão do trabalho. Segundo ele, o entendimento da corte é de que “o princípio constitucional da livre iniciativa autoriza a adoção de estratégias negociais distintas do modelo empregatício”.

O relator explicou que tais estratégias não geram, por si sós, precarização do trabalho, violação da dignidade do trabalhador ou desrespeito a direitos previdenciários. Para o magistrado, o TRT-2 não indicou “qualquer exercício abusivo nas contratações com a intenção de fraudar a existência de vínculo empregatício”.

O ministro ainda ressaltou que os corretores não são vulneráveis, pois tinham conhecimentos suficientes para compreender os termos e as implicações dos contratos firmados.

Enxurrada de ações

A defesa da Prudential entende que a empresa vem sendo vítima de advocacia predatória, devido ao grande número de ações judiciais que buscam o reconhecimento de vínculo de emprego nos contratos de franquia firmados com corretores.

A seguradora já obteve diversas vitórias em casos do tipo — em primeira instância, em diferentes TRTs (das 1ª, 2ª, 3ª, 9ª e 18ª Regiões, por exemplo), no Tribunal Superior do Trabalho e nas duas turmas (1ª e 2ª) do STF.

A Corte Constitucional já julgou ao menos 25 reclamações apresentadas pela Prudential e validou o modelo de franquia em todas elas.

O argumento mais usado é o de que o STF tem reconhecido de forma reiterada as formas de divisão de trabalho não reguladas pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Os principais exemplos são os precedentes vinculantes citados na decisão de Nunes Marques.

O TST recentemente reafirmou a competência da Justiça comum para julgar ações relacionadas a contratos de franquia.

Há, ainda, no Supremo uma ação que busca definir a competência para o julgamento de casos do tipo. Na chamada ADPF das Franquias (ADPF 1.149), o Partido Novo defende a competência da Justiça comum para julgar tais processos.

A Procuradoria-Geral da República já defendeu que a Justiça do Trabalho só poderia discutir a possibilidade de vínculo empregatício nos casos em que a Justiça comum considerar que houve fraude no contrato de franquia.

FONTE: Conjur | FOTO: Fellipe Sampaio