O funcionário era dependente químico e foi dispensado por justa causa após recusa de participar de programa de prevenção contra álcool e entorpecentes. A empregadora, uma mineradora, já havia aplicado avaliações disciplinares mais brandas pelo mesmo motivo, uma advertência e uma suspensão, até que, por fim, decidiu se valer da mais grave deliberação a ser imposta ao trabalhador: a justa causa.

Mas o que, a princípio, poderia parecer um caminho processual na aplicação de deliberações gradativas, com o objetivo de recuperar o empresário, até culminar com a dispensa por justa causa, não foi validado pelos juízes da Primeira Turma do TRT-MG, por envolver funcionário dependente químico. Acompanhando o voto do desembargador Luiz Otávio Linhares Renault, como relator, os membros do colegiado deram provimento ao recurso dos familiares do trabalhador, falecido no curso do processo, para considerar que a despedida foi, na verdade, sem justa causa.

A prova documental revelou que, em agosto de 2016, o falecido se comprometeu a submeter-se ao tratamento de prevenção do uso de álcool e entorpecentes oferecidos pelo empregador, o que resultou em indenização disciplinar, advertências.

Em janeiro de 2018, novamente, o trabalhador conseguiu tratamento disponibilizado pela empresa, por meio do programa de prevenção ao uso de álcool e entorpecentes (PPAE). Por esse motivo, a empresa solicitou-lhe uma suspensão de suspensão de três dias de trabalho, por ato de insubordinação.

Em 06/04/2018, o empresário testou positivo no teste de ar expirado em etilômetro e, mais uma vez, decidiu-se a participar do tratamento oferecido pelo empregador, para prevenção ao uso de álcool e entorpecentes. Dessa vez, um empregador decidiu dispensá-lo por justa causa, nos termos do artigo 482, “h”, da CLT (ato de indisciplina ou de insubordinação).

Inconformado, o trabalhador entrou em juízo para tentar reverter a medida, mas o juízo da Vara do Trabalho de Congonhas foi lícita a dispensa e julgou improcedentes os pedidos. Na sentença, constou, inclusive, que a empresa poderia ter aplicado a deliberação de imediato diante da falta praticada, mas ainda assim inspirou a gradação do exercício do poder disciplinar, conferindo ao empregado a oportunidade de reabilitação.

Entretanto, em grau de recurso, o relator colegiado de segundo grau chegou a conclusões diversas. Isso porque ficou evidenciado que o empresário era viciado em álcool, tanto que as punições foram todas calcadas nesse fato, o que impediu a aplicação da justa causa.

“ Via de regra, o dependente químico, álcool ou qualquer outro tipo de droga entorpecente, recusa-se a participar de programas de recuperação, vedados sendo o tratamento ou a internação compulsória, de modo que a recusa do reclamante à submissão ao atendimento do Programa de Prevenção para o Álcool e Entorpecentes não poderia, associada a outra situação de positividade no teste de ar expirado em etilômetro, servir de fundamento para a dispensa por justa causa ”, ponderou no voto condutor.

Para complementar os fundamentos da decisão, o relator citado do TRT da 3ª Região no sentido de que o alcoolismo moderno se trata de doença e não deve dar ensinamento por justa causa. O correto seria o empregador encaminhar o empresário para tratamento médico junto ao INSS.

DISPENSA POR JUSTA CAUSA – EMBRIAGUEZ – ARTIGO 482, “f”, DA CLT. A herança vinha se firmando no sentido de que a embriaguez em serviço não precisaria se repetir para autorizar a dispensa por justa causa. No entanto, atualmente, quando de tal prática pelo empresário, vários fatores devem ser considerados. O avanço da ciência, no campo da medicina, evidenciou que o alcoolismo consiste em uma doença, da qual não se tem que culpar o indivíduo, paciente por dependência química e não moral. Assim, ao tomar conhecimento da embriaguez do empregador, em serviço, ou não (artigo 482/CLT), caberá ao empregador encaminhá-lo a tratamento e obtenção de licença médica, que será concedida gratuitamente, se necessário. Passando-o para a responsabilidade do Estado, obstará possíveis prejuízos que o empregado pudesse, com a sua doença, acarretar ao empreendimento ou aos seus colegas de trabalho. Processo 00140-2004-072-03-00-7 RO Data de Publicação 15/06/2004 Órgão Julgador Quarta Turma Relator Antônio Álvares da Silva.

ALCOOLISMO. DISCRIMINAÇÃO. INVALIDADE DA DISPENSA. REINTEGRAÇÃO. Considerando que o autor era portador de alcoolismo clássico (doença formalmente reconhecida pelo Código Internacional de Doenças (CID) da Organização Mundial de Saúde – OMS), caberia à reclamada proceder à suspensão do contrato de trabalho, seguida de encaminhamento do empregado ao INSS. Contudo, a empresa tratou a referida doença como desvio de conduta justificador de rescisão do contrato de trabalho, impondo-se, assim, o reconhecimento da invalidade da dispensa. Inválido ou ato, o empresário tem direito à reintegração no emprego. Precedentes deste E. Regional e do C. TST. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010260-04.2017.5.03.0012 (AP); Disponibilização: 26/02/2018, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 719; Órgão Julgador: Quarta Turma; Relatora: Maria Lúcia Cardoso Magalhães).

Nesse contexto, após considerar inválida a dispensa por justa causa e considerar que a despedida foi sem justa causa, o relator condenou a mineradora a pagar aviso-prévio, 13º salário, férias acrescidas de 1/3 e indenização de 40% do FGTS. Atualmente, o processo aguarda decisão de admissibilidade do recurso de revista.

FONTE: TRT 3 | FOTO: Sergeitokmakov