Em plenário virtual encerrado nesta sexta-feira, 8, o STF julgou que o Estado deve ser responsabilizado pela morte de vítima de disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares quando a perícia que determina a origem do disparo for inconclusiva. A matéria é objeto do ARE 1.385.315, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.237).

No entanto, não houve uma definição sobre o tema. O julgamento teve quatro correntes diferentes de votos, e nenhuma alcançou maioria.

Voto do relator

Relator do caso, ministro Edson Fachin entendeu que os familiares de Vanderlei devem receber R$ 300 mil de indenização, sendo R$ 200 mil para os pais e R$ 100 mil para o irmão, além de ressarcimento dos gastos com funeral e pensão vitalícia.

Para o ministro, diante da falta de investigação sobre a morte, o Estado deve ser responsabilizado pelos danos causados em operação policial “haja vista que o nexo causal entre a conduta e o resultado configura-se pelo fato de o Estado assumir o risco de realizar operação em área habitada, e a responsabilidade estatal somente poderia ser afastada acaso comprovada a ocorrência de força maior, caso fortuito, ou fato exclusivo da vítima”.

Eis a tese proposta:

“Sem perícia conclusiva que afaste o nexo, há responsabilidade do Estado pelas causalidades em operações de segurança pública.”

Os ministros Gilmas Mendes, Cármen Lúcia e Rosa Weber acompanharam Fachin.

Divergências

Abrindo divergência, o ministro André Mendonça votou na possibilidade do Estado se eximir da responsabilização quando demonstrar que, “apesar de todos os esforços técnicos, e em tempo razoável que não inviabilize a  colheita de provas ou informações, a perícia invariavelmente seria não conclusiva”.

O ministro propôs a tese:

“a) o Estado é responsável por morte de vítima de disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares em comunidade, quando a perícia que determina a origem do disparo for inconclusiva, desde que se mostre plausível o alvejamento por agente de segurança pública;

b) Poderá o Estado se eximir da responsabilização civil, caso demonstre a total impossibilidade da perícia, mediante o emprego tempestivo dos instrumentos técnicos disponíveis, para elucidação dos fatos.”

Já em relação ao caso concreto, o ministro votou para condenar somente a União nos valores indenizatórios arbitrados, em parcial provimento do recurso extraordinário, haja vista a não participação da PM/RJ no momento dos fatos.

Os ministros Dias Toffoli e Nunes Marques acompanharam Mendonça.

Ministro Alexandre de Moraes, por sua vez, votou no sentido de negar provimento ao recurso extraordinário, com a seguinte tese: “A responsabilidade estatal por morte de vítima, por disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares em comunidade, pressupõe a comprovação de que o projétil partiu dos agentes do Estado”.

O ministro Luiz Fux seguiu entendimento de Alexandre de Moraes.

Abrindo uma quarta corrente, o ministro Cristiano Zanin, divergiu quanto à responsabilidade atribuída ao Estado, pois “inexiste registro de operação da Polícia Militar do Rio de Janeiro no dia do evento”.

Eis a tese proposta:

“i) a responsabilidade civil do Estado, na forma do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, opera sob a teoria do risco administrativo, cabendo a oposição, se o caso, de excludentes de responsabilidade pelo ente federativo;

(ii) a perícia inconclusiva sobre a origem de disparo fatal durante operações policiais e militares não é suficiente, por si só, para afastar a responsabilidade civil do Estado.”

O ministro Luís Roberto Barroso seguiu entendimento de Zanin.

Entenda o caso

O caso diz respeito à morte de Vanderlei Conceição de Albuquerque, de 34 anos, em junho de 2015, atingido por projétil de arma de fogo dentro de casa, na comunidade de Manguinhos, no RJ, durante tiroteio entre moradores, militares do Exército e policiais militares. Sua família moveu ação contra a União e o Estado, mas o juízo de 1º grau julgou improcedentes os pedidos de indenização por danos morais, ressarcimento das despesas do funeral e pensão vitalícia.

A decisão baseou-se na ausência de comprovação de que o disparo que causou a morte teria sido realizado por militares do Exército.

O TRF da 2ª região manteve a decisão. Segundo o Tribunal, não havia dados que vinculem o ocorrido à atuação dos militares da Força de Pacificação do Exército na comunidade, pois o laudo pericial foi inconclusivo quanto à origem do projétil. Ainda de acordo com a decisão, também não ficou comprovada nenhuma conduta omissiva específica dos agentes públicos que configure a responsabilidade civil e o consequente dever de indenizar.

No STF, a família argumenta que é totalmente desnecessária a discussão sobre a origem da bala que vitimou o morador, porque o Estado, de acordo com o parágrafo 6° do artigo 37 da CF, responde objetivamente pelos danos causados por seus agentes a terceiros.

FONTE: Portal Migalhas | FOTO: Agência Brasil