O litoral do Rio Grande do Norte tem se projetado como um dos principais polos de investimento imobiliário do Nordeste brasileiro. De Natal a São Miguel do Gostoso, passando por Parnamirim, Nísia Floresta, Extremoz, Touros e Tibau do Sul, observa-se uma expansão contínua de empreendimentos turísticos, residenciais e outros (especialmente no campo das energias renováveis). A combinação de belezas naturais, clima favorável, infraestrutura crescente, demanda aquecida pelo turismo de sol e mar e qualidade de vida têm impulsionado a implantação de resorts, loteamentos e condomínios de alto padrão nessa faixa costeira.

Contudo, tal dinâmica de crescimento não se dá sem tensões jurídicas e ambientais. A ocupação do litoral brasileiro, em especial na região Nordeste do Brasil, carrega em seu bojo a necessidade de compatibilizar desenvolvimento econômico com preservação ambiental, desafio que se torna ainda mais evidente em Estados como o Rio Grande do Norte, onde os ecossistemas costeiros possuem relevância estratégica para a proteção da biodiversidade e para a manutenção dos serviços ecossistêmicos.

A Constituição Federal de 1988 é categórica ao reconhecer a zona costeira como patrimônio nacional (§4º do art. 225) (1), submetendo-a a um regime jurídico especial que impõe limites e condições para o seu uso. Além da proteção constitucional, a zona costeira é regulada por normas específicas, como a Lei nº 7.661/1988 (arts. 2º e 3ª) (2), que instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, o Código Florestal (Lei nº 12.651/2012) (3), que protege dunas, restingas e manguezais como Áreas de Preservação Permanente (art. 4ª, incisos VI e VII), e diversas resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente, que detalham os critérios para intervenções em áreas sensíveis, a saber, Resoluções CONAMA nº 312/2002; 341/2003; CONAMA nº 274/2000; 413/2009; entre outras (4).

Não menos importante é a particularidade fundiária de boa parte do nosso litoral. A incidência de terrenos de marinha, bens da União situados em faixas próximas ao mar e cursos d’água, impõe a necessidade de processos próprios de regularização, como o aforamento ou a cessão de uso, sob pena de comprometimento jurídico do empreendimento e dos contratos que dele derivam. Ignorar esse aspecto, muitas vezes relegado a segundo plano nas fases iniciais dos projetos, pode gerar passivos jurídicos (administrativos e ambientais) de difícil reversão.

Outro vetor de complexidade são as exigências dos processos de licenciamento ambiental. A instalação de empreendimentos de maior porte (considerados potencialmente causadores de significativa degradação ambiental – art. 225, §1º, inciso IV) em áreas litorâneas geralmente demandam a apresentação de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), instrumentos que não apenas avaliam a viabilidade ambiental do projeto, mas também subsidiam o debate público e a participação social (5).

A inadequação desses estudos ou a omissão de informações relevantes pode ensejar a anulação do licenciamento e a responsabilização administrativa, civil e até criminal dos responsáveis. Tais responsabilidades podem recair sobre os técnicos que elaboraram os estudos ambientais em tela, bem como sobre os analistas ambientais, integrantes da administração pública ambiental, bem como o empreendedor (pessoa jurídica e/ou responsáveis pela sua gestão), na medida da participação e culpabilidade de cada um, neste último caso quando se tratar de crimes ambientais.

Não se pode olvidar, ainda, do papel que os Planos Diretores Municipais desempenham, uma vez que estes podem estabelecer zonas de proteção, prescrições urbanísticas e diretrizes específicas para o uso e a ocupação do solo nas áreas costeiras. Em muitos municípios potiguares, tais instrumentos têm sido atualizados ou revistos para atender às novas demandas dos setores imobiliário, hoteleiro, do turismo, entre outros, criando camadas adicionais de normas a serem observadas pelos investidores.

Nesse cenário, a expansão imobiliária no litoral do Rio Grande do Norte se revela como uma oportunidade promissora, mas que exige uma abordagem criteriosa e tecnicamente embasada. A conjugação entre o aproveitamento econômico e a preservação dos atributos naturais e culturais da zona costeira não é apenas uma imposição legal. Trata-se de uma condição indispensável para a perenidade dos investimentos e para a manutenção da atratividade turística, contemplativa e especulativa na região, sem prejuízo de outros projetos.

Em síntese, pode-se afirmar que os desafios jurídicos e ambientais associados à ocupação do litoral potiguar são complexos e exigem do empreendedor, ou de quem lhe acompanha (assessora), a) uma visão integrada (multidisciplinar) e sensível  do conjunto ambiental, b) conhecimentos da geografia regional, c) sólida formação jusambiental e jusurbanística para compreender riscos, evitar violações normativas e garantir segurança jurídica ao empreendimento proposto.

O futuro dos empreendimentos costeiros, mais do que nunca, dependerá da capacidade de seus idealizadores de compreenderem e respeitarem os limites do ambiente, transformando o rigor técnico em diferencial competitivo e em garantia de segurança jurídica. A experiência ensina que, na relação entre desenvolvimento imobiliário e proteção ambiental, a omissão ou o desconhecimento técnico podem custar tudo ao empreendedor. Nesse sentido, planejar, conhecer e respeitar os contornos normativos é, ao final, investir na longevidade e no sucesso dos próprios empreendimentos.

Referências bibliográficas

(1) BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm. Acesso em: 26 abr. 2025.

(2) BRASIL. Lei nº 7.661, de 16 de maio de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7661.htm. Acesso em: 26 abr. 2025.

(3) BRASIL. Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/L12651compilado.htm. Acesso em: 26 abr. 2025.

(4) CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE (CONAMA). Conselho Nacional do Meio Ambiente. Disponível em: https://conama.mma.gov.br/. Acesso em: 26 abr. 2025.

(5) BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm. Acesso em: 26 abr. 2025.

OBS: Imagem extraída do site: https://www.topensandoemviajar.com/resort-natal-rn>. Acesso em 26 de abril de 2025.