Por maioria de votos, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso especial de um homem que, após realizar exame de DNA e descobrir que não era o pai biológico de um adolescente, solicitou a retirada de seu nome do registro civil do filho.

Segundo o colegiado, apesar de os autos apontarem para a ocorrência de vício de consentimento – pois o homem registrou a paternidade por acreditar haver vínculo biológico entre ele e a criança –, o colegiado considerou inviável a retificação do documento para exclusão da paternidade por existir prova de vínculo socioafetivo entre ambos.

“A divergência entre a paternidade biológica e a declarada no registro de nascimento não é apta, por si só, para anular o registro”, destacou a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi.

De acordo com o processo, antes do exame de DNA, pai e filho mantinham uma relação saudável, incluindo viagens, pagamento de despesas e boa convivência com os demais parentes. Depois do resultado do exame, o homem “devolveu” o adolescente a sua avó materna e pediu judicialmente a retificação do registro do filho.

Ao julgarem improcedentes a ação negatória de paternidade e o pedido de alteração do registro, as instâncias ordinárias mantiveram o reconhecimento da filiação socioafetiva entre as partes. O Tribunal de Justiça de Goiás apontou, entre outros pontos, a necessidade de se conservar a relação de afeto construída previamente, ainda que os dois tenham se distanciado após descobrirem que não tinham vínculo biológico.

Em recurso especial, o homem argumentou que a relação socioafetiva deixou de existir quando a verdade sobre a paternidade veio à tona, tendo se afastado do jovem há cerca de nove anos.

Requisitos para anulação do registro de nascimento são cumulativos
Em seu voto, a ministra Nancy Andrighi mencionou que, nos termos do artigo 1.604 do Código Civil (CC), não é possível, como regra, reivindicar alteração de filiação constante de registro civil, salvo se houver prova de erro ou de falsidade na declaração.

A ministra destacou que a jurisprudência do STJ consolidou dois requisitos cumulativos necessários para a anulação de registro de nascimento: a) a existência de prova clara de que o pai foi induzido a erro, ou, ainda, que tenha sido coagido a realizar o registro; e b) a inexistência de relação socioafetiva entre pai e filho.

Sobre o primeiro requisito, a relatora verificou que o recorrente registrou a criança como filho ao acreditar na palavra da mãe, a qual disse ser ele o pai. “Portanto, e conforme reconheceu a corte estadual, o registro foi realizado mediante vício de consentimento”, afirmou.

Depoimentos colhidos no processo deixam claro o vínculo socioafetivo
Nancy Andrighi explicou também que a paternidade socioafetiva é reconhecida no artigo 1.593 do CC, o qual define o parentesco como “natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”. A expressão “outra origem” – detalhou – não deixa dúvidas de que “os vínculos afetivos fundados em amor, carinho, atenção, dedicação, preocupações e responsabilidades entre pais e filhos devem ser protegidos e reconhecidos pelo ordenamento jurídico brasileiro”.

No caso dos autos, a relatora ressaltou que os depoimentos colhidos em audiência não deixaram dúvidas sobre a existência de vínculo socioafetivo, que não se apagou completamente mesmo após o resultado negativo do exame de DNA.

“Desse modo, não se verifica a presença cumulativa dos dois requisitos autorizadores à anulação do registro de nascimento, não merecendo reparo o acórdão recorrido”, concluiu a ministra.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

FONTE: STJ |  FOTO: Freepik