A discriminação contra a pessoa homossexual é equiparada a atos de racismo, de acordo com a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão 26, e, portanto, passível de punição.

Com esse entendimento, a 10ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou um professor da rede municipal infantil de São Paulo por perseguir um colega de trabalho em razão de sua orientação sexual.

Segundo o processo, o professor criou um grupo no WhatsApp com os pais de seus alunos, em que frequentemente insinuava que o coordenador da escola, que é homossexual, queria implantar uma suposta “ideologia de gênero”. Em uma das ocasiões, o réu compartilhou uma foto tirada do Instagram do coordenador, em que ele usava uma peruca rosa, depreciando a vítima.

O acusado também disse, no grupo, que o colega de trabalho queria alterar o Currículo da Cidade (documento municipal que dá as diretrizes para as atividades das escolas públicas) para implantar a suposta ideologia. Com essas e outras suposições, o professor incitou o ódio ao colega, que chegou a sofrer denúncias de alguns pais na Diretoria de Ensino.

O coordenador processou o réu. Em primeira instância, ele foi absolvido. A vítima e o Ministério Público recorreram da decisão.

Materialidade confirmada
No TJ-SP, os desembargadores analisaram que a materialidade do delito foi consolidada pelo boletim de ocorrência e pelos depoimentos das testemunhas ainda na primeira fase processual.

Ouvido novamente em juízo, o réu se defendeu dizendo que não é homofóbico e que só se posicionou contra a agenda do coordenador de implantar a suposta “ideologia de gênero”, com banheiros mistos e outras atividades.

Já o autor, também em depoimento, disse que nunca alterou ou pretendeu alterar qualquer item do currículo escolar, mesmo porque as diretrizes são feitas pela prefeitura. Ele aduziu que outros professores da escola temeram por sua integridade física, já que ela era perseguido pelo réu, e que chegou a ficar afastado por problemas psiquiátricos causados pela perseguição.

Uma mãe de um aluno, em seu depoimento, confirmou a versão do coordenador. Ela disse que se lembra de ter ouvido o réu falar em uma reunião que era abertamente preconceituoso quanto à homossexualidade.

Para os desembargadores, os depoimentos comprovaram que o acusado ofendeu dolosamente a dignidade e o decoro do recorrente, utilizando-se de elementos referentes à sua orientação sexual. O colegiado reformou a sentença e condenou o professor a dois anos e quatro meses de reclusão em regime inicial aberto, além do pagamento de 11 dias-multa.

“Respeitada a decisão do Juízo a quo, a meu ver, não se mostra adequado o entendimento constante da sentença de que se trata de confrontação resultante de ‘polarização ideológica, ligada ao dia a dia das crianças’, tampouco a situação deve ser admitida sob a ótica da mera opinião de pessoas”, escreveu o relator, desembargador Nelson Fonseca Júnior.

O caso, disse o magistrado, é “de aplicação direta da lei penal, que tipifica criminalmente a manifestação de preconceito e discriminação, como no caso em apreço. Logo, a procedência da acusação, pelo crime descrito na denúncia, é mesmo de rigor”.

O advogado Felipe Brandão Daier defendeu a vítima.

Processo 1501306-49.2022.8.26.0004

FONTE: Conjur | FOTO: PIxabay