
O cantor e produtor musical Carlinhos Brown, bem como duas empresas de produção artística e realização de eventos, foram condenados pela Justiça da Bahia a indenizar o artista plástico Wilton Nascimento Bernardo dos Santos em R$ 40 mil por danos morais, por terem utilizado personagens criados por ele sem a devida autorização, e sem reconhecimento de coautoria.
O caso envolve a criação dos personagens indígenas “Paxuá” e “Paramim”, do livro infantil escrito pelo músico. Decisão é do juiz de Direito Paulo Henrique Barreto Albiani Alves, da 10ª Vara Cível e Comercial de Salvador/BA. A sentença também impôs a obrigação de reconhecimento da coautoria, além de medidas para cessar o uso indevido das obras.
O caso teve início em 2012, quando Wilton Bernardo foi convidado a ilustrar um livro didático-infantil com os personagens Paxuá e Paramim.
À época, segundo ele, os personagens não tinham identidade visual definida, e a criação de suas aparências se deu exclusivamente por seu trabalho intelectual, com esboços e estudos originais. O projeto, vinculado a uma exposição de Carlinhos Brown, previa uso educacional das ilustrações, sem finalidade econômica. Pelo trabalho, o homem recebeu R$ 1 mil.
Contudo, segundo Wilton, os personagens passaram a ser utilizados em larga escala em diversos produtos e campanhas – incluindo projeto de R$ 1,3 milhão com a Neoenergia – sem sua autorização ou menção à sua coautoria.
Em juízo, ele afirmou ser ilustrador e coautor dos personagens, razão pela qual afirmou possuir direitos patrimoniais sobre a obra. Pleiteou, assim, reconhecimento da coautoria, reparações e a cessação do uso indevido.
Decisão judicial
Na sentença, o magistrado reconheceu que Wilton foi mais do que um simples executor de ilustrações. “Foi o autor quem, por meio de seu trabalho intelectual e criativo, deu forma e expressão visual aos personagens, definindo as características e demais elementos que compõem sua identidade gráfica.”
A sentença acolheu a tese de que a contribuição do artista plástico foi criativa e original, o que caracteriza coautoria nos termos da lei de direitos autorais (9.610/98).
A prova pericial foi decisiva: o laudo apontou semelhanças marcantes entre os personagens desenhados por Wilton e as versões posteriormente exploradas comercialmente, confirmando que estas mantinham “dominância na mesma identidade visual”. “Sem a criação original, certamente não haveria os personagens posteriores tal como são.”
Além disso, destacou-se que a autorização dada por Wilton se restringia ao uso pontual na exposição de 2012. Não houve cessão de direitos autorais para usos futuros ou comerciais. A ausência de contrato escrito formalizando qualquer cessão reforçou a ilegalidade da exploração posterior.
A sentença reconheceu a responsabilidade solidária dos réus Carlinhos Brown, as empresas Candyall Music Produções Artísticas LTDA e Pilar das Produções e Eventos LTDA, além da Neoenergia S/A. Para o magistrado, a empresa de energia deveria ter verificado previamente a titularidade dos direitos autorais antes de utilizar os personagens em projetos comerciais.
“A supressão da coautoria não configura um erro administrativo ou uma omissão casual: é uma forma de apagamento simbólico, que atinge a honra subjetiva e objetiva do autor no meio artístico e profissional.”
A decisão impôs as seguintes obrigações:
- Reconhecimento público da coautoria: publicação em jornal de grande circulação por três vezes consecutivas.
- Indenização por danos morais: fixada em R$ 40 mil.
- Indenização por danos materiais: valor a ser apurado em liquidação de sentença.
- Apresentação dos contratos envolvendo os personagens.
- Proibição de uso futuro dos personagens sem autorização expressa e sem menção à coautoria de Wilton Bernardo.
A multa diária por descumprimento das obrigações foi fixada em R$ 1 mil. O magistrado ainda negou pedido de reconvenção, feito pelos réus por suposto dano moral ao músico, por não vislumbrar má-fé na propositura da ação. Segundo o juiz, o autor agiu dentro dos limites do ordenamento jurídico e teve suas alegações confirmadas por robustas provas técnicas e testemunhais.
Processo: 0538672-75.2018.8.05.0001
FONTE: Migalhas | FOTO: Héber Barros