
Quem pode mais, pode menos. Com outras palavras, mas com essa lógica, a 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais deu provimento à apelação de três condenados por integrar organização criminosa e lavagem de dinheiro, anulando o processo a partir de seus interrogatórios. O acórdão determinou ao juízo de origem ouvi-los de novo, garantindo-lhes o direito ao silêncio parcial, que havia sido negado.
O colegiado ainda estendeu de ofício os efeitos de sua decisão aos demais corréus, a fim de que os novos interrogatórios de todos os acusados sejam feitos “com a observância dos direitos constitucionais à ampla defesa e à não autoincriminação, notadamente o direito ao silêncio, total ou parcial, devendo ser prolatada nova sentença, após a apresentação das alegações finais pelas partes”.
Os réus alegaram cerceamento de defesa. Segundo eles, o juízo de primeiro grau não permitiu que eles respondessem no interrogatório apenas às perguntas formuladas pelos respectivos advogados. Conforme a julgadora que presidiu a audiência, o Ministério Público e a defesa só devem fazer perguntas “complementares” às do juiz e, se o réu se negar a respondê-las, o que é seu direito, não há nada a ser acrescentado.
Segundo a juíza, o seu dever é zelar pela “paridade de armas” entre as partes. Por isso, não cabe permitir o silêncio dos acusados nos questionamentos do MP e possibilitar que eles se manifestem nas indagações da defesa. Contudo, para não se alegar cerceamento de defesa, a julgadora facultou aos advogados constarem nas alegações finais aquilo que os clientes pretendiam dizer em seus interrogatórios.
Silêncio seletivo
“O interrogatório é um legítimo meio de defesa, tratando-se da oportunidade processual em que o acusado poderá praticar a sua autodefesa, ainda que opte por manter-se em silêncio, mesmo que de maneira parcial”, frisou o desembargador Agostinho Gomes de Azevedo. Ele citou que a Constituição Federal (artigo 5º, inciso LXIII) e o Código de Processo Penal (artigos 186 e 198) preveem o direito do réu de permanecer calado.
Relator da apelação, Azevedo explicou que a garantia ao silêncio é para evitar que os acusados produzam provas contra si. “Verifica-se que os acusados possuem o direito constitucional de silenciarem-se em relação à totalidade das perguntas, não havendo qualquer vedação interpretativa que os impeça de silenciarem-se em parte do que lhes será perguntado”. O desembargador também criticou o juízo de primeira instância.
“A negativa por parte da magistrada de possibilitar o exercício ao nemo tenetur se detegere (ninguém é obrigado a se incriminar) de maneira parcial demonstra não só um desrespeito ao direito da autodefesa, como também a violação de uma garantia fundamental, o que gera evidente prejuízo ao exercício do contraditório e da ampla defesa”, concluiu Azevedo.
Os desembargadores Sálvio Chaves e Paulo Calmon Nogueira da Gama seguiram o relator, inclusive para estender os efeitos do acórdão aos demais acusados. A ação penal tramita na comarca de Belo Horizonte e tem 11 réus, dos quais dois foram absolvidos. Os nove que foram condenados recorreram, mas apenas as defesas de três arguiram a preliminar de nulidade do feito devido à negativa de silêncio parcial nos interrogatórios.
FONTE: Conjur | FOTO: Mirna de Moura/TJMG