
O dever de revelação não se limita ao período da indicação e aceitação dos árbitros pelas partes, perdurando durante todo o processo, como resguardo necessário à imparcialidade dos julgadores e do próprio tribunal.
Esse entendimento é da 27ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo. A corte anulou uma sentença arbitral contra a Orion Geradora de Energia por considerar que um dos árbitros quebrou o dever de revelação. Na arbitragem, agora anulada, a Orion havia sido condenada a indenizar a empresa Engie Brasil Energia.
Segundo o pedido analisado pelo TJ-SP, um dos árbitros apresentou declarações conflitantes a respeito de sua relação com um dos sócios do escritório de advocacia contratado pela Engie Brasil Energia, parte vencedora na arbitragem.
Na primeira declaração, o árbitro disse que não tinha qualquer relação com o advogado. Em uma segunda declaração, porém, afirmou que seu cliente poderia ter contratado o advogado de
uma parte. Ainda segundo a solicitação julgada pelo TJ-SP, em 2017, o árbitro indicou o causídico para presidir um tribunal arbitral do qual fazia parte, informação que não foi revelada de imediato.
“Dada ou não publicidade ao certame de atuação conjunta do árbitro e do advogado da ré, o fato em si mesmo considerado é relevante, porque, a partir dele e em razão dele, era lícito a qualquer um questionar a imparcialidade e a independência do árbitro em arbitragens simultâneas”, sustentou em seu voto o desembargador Alfredo Attié, relator da matéria.
Dever violado
De acordo com ele, houve no caso concreto violação ao dever de revelação, uma vez que a relação entre o árbitro e o advogado da parte vencedora deveria ter sido informada, já que os dois se conheciam desde o início do processo.
“O dever de revelar não se limita ao período da indicação e aceitação dos árbitros pelas partes, mas perdura durante todo o processo arbitral, como resguardo necessário à imparcialidade dos julgadores e do próprio tribunal arbitral, concretizando os direitos fundamentais correlatos de imparcialidade e vedação de tribunal de exceção.”
Segundo o TJ-SP, houve entre agentes da arbitragem um relacionamento que “extrapolou o ordinário, o corriqueiro, o casual, o eventual e a coincidência”.
“Na hipótese dos autos, o árbitro e a ré, representada por seu advogado e coárbitro com aquele, deliberadamente omitiram o fato da autora e, ao fazê-lo, ainda que por entenderem não ter havido comprometimento da imparcialidade e da independência, retiraram dela os juízos, próprios e intransferíveis, de conveniência e de oportunidade.”
Processo: 0024255-13.2023.8.26.0100
FONTE: Conjur | FOTO: Antonio Carreta/TJSP