Liliana, é o meu primeiro nome. Quem escolheu foi a minha irmã, quando tinha 6 anos e descobriu que ia ganhar uma irmãzinha para brincar. Na época, segundo ela, uma amiga da turma da escola, com esse mesmo nome, era bem danadinha e vivia dando trabalho à Professora. Ela falou que queria que eu tivesse o mesmo nome para quebrar o mito de que todas as Lilianas eram assim. Quanta responsabilidade eu já assumi, mesmo antes de nascer.

Bastos. Esse sobrenome eu herdei da minha mãe. Uma mulher muito elegante e inteligente que dedicou toda a sua vida para a educação das duas filhas. Dela herdei também um mimo incurável e uma capacidade de resiliência quase insuportável. Com ela aprendi que os filhos são a nossa maior prioridade, a nossa família é o nosso bem mais precioso e que precisamos cultivar diariamente com amor e cuidado.

Lembra-me também, em especial, o meu avô materno, cuja imagem eu guardo para mim de um homem incrivelmente carinhoso e cuidadoso com os netos. Sempre tinha uma balinha para a minha aparente tosse crônica que surgia, apenas, na presença dele, naturalmente. Um jeito típico de quem já criou os filhos e está estragando os netos.

Pereira. Nome típico de família portuguesa. Este eu herdei em dobro do meu pai e da minha mãe. Minhas duas avós, vindas de um lugar bem próximo, provaram o quanto o sexo feminino é guerreiro e trabalhador. Resistentes às intempéries da vida, batalhadoras até ao final. Que exemplo eu tive o privilégio de conviver.

Santo. Aqui merece algumas ressalvas. Poderia dizer que o nome é herança do meu avô paterno, homem que partiu muito antes de eu fazer parte da família. Em parte, é verdade. O nome foi registrado errado no cartório e, naquela época, não era tão fácil assim corrigir. Quando deveria ter escrito Santos, ficou Santo. O meu pai acredita que de tantos filhos registrados o cartório já estava cansado, cortando assim uma pequena letra no nome.  Isso trouxe uma identidade própria ao meu pai e a tudo que ele conquistou desde então. Um homem determinado, batalhador, sobrevivente da guerra e protetor da família com todas as forças que tem.

Não posso falar na família do meu pai, sem mencionar a herança da minha tia freira que me acolheu numa jornada de autoconhecimento em Timor-Leste. Com uma estabilidade desejada por muitos, eu decido largar tudo e seguir rumo a uma aventura do outro lado do mundo com o especial objetivo de ajudar os outros. Mal sabia eu que essa jornada ia ser um verdadeiro divisor de águas na minha vida. Encontrei-me como mulher, como profissional e como ser humano. Muito da minha essência e das habilidades profissionais que tenho hoje nasceram naquelas terras de ninguém. Talvez, quem precisasse de ajuda fosse eu.

Com o espírito aventureiro, característico dos portugueses do passado, desbravei mundos e conquistei feitos inalcançáveis, apenas com a força da minha determinação e ousadia. Na volta dessa jornada, fiz a minha inscrição do Doutorado em Coimbra. E aqui termina a minha versão portuguesa. Mas não é tudo. Na verdade, a minha história está só começando.

Nas salas de aula tradicionais da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, conheci um rapaz, brasileiro, que apesar da minha resistência conquistou o meu coração. Juntos, seguimos fortes nesta missão tão nobre que é a família. E como não poderia deixar de ser, parte da história dele faz parte da minha também. E por isso, não poderia deixar de a contemplar no meu nome. Seguimos então.

Azevedo. Família de raízes judaicas que remete ao lado materno do meu marido. Mulheres fortes e batalhadoras, que me acolheram como se eu fizesse parte da família desde sempre. Com certeza, fazem parte de mim, da minha história e do legado que, um dia, eu deixarei.

Rodrigues. Meu último sobrenome. Aqui temos a essência do lado paterno do meu marido. Outra família que eu ganhei de presente, mesmo antes de conhecer e vir morar para Natal, cidade incrível que me abraçou desde o primeiro dia que cheguei. Uma família de comerciantes que provam que é possível concretizar nossos sonhos em qualquer idade. Guardo cada um no meu coração.

Liliana Bastos Pereira Santo de Azevedo Rodrigues. Este é o meu nome. Mas seria apenas um nome se não contasse um pouco da minha história, um pouco das minhas raízes e um pouco da minha essência. Esta é a primeira lição que tenho para vocês sobre o compliance.

E a sua história, como é?

FOTO: Getty Images